Com dados relativos a seis meses de governo já é possível dar
uma primeira olhada no comportamento da despesa e verificar o esforço de ajuste
fiscal do time do Paulo Guedes. No primeiro semestre de 2019 o governo gastou
R$ 653,8 bilhões com despesas primárias em valores correntes, se for ajustado
pela inflação o gasto foi de R$ 658,4 bilhões em valores de junho de 2019. Com
os devidos ajustes o gasto no primeiro semestre corresponde 47,26% do total
permitido pelo teto de gastos, um número preocupante se considerarmos que a
despesa no segundo semestre costuma ser maior do que no primeiro semestre.
Considerado o período de 1997 a 2018 a despesa do segundo
semestre foi em média 18% maior que a do primeiro semestre, se considerarmos
apenas o período posterior a 2014 esta proporção cai para 13%. Desta forma a
valer a proporção mais recente o governo está em cima do teto, não pode nem
piscar, a valer a proporção do período inteiro o governo está acima do teto e
vai precisar de mais ajustes no segundo semestre. Não fosse o esforço fiscal do
primeiro semestre a situação podia ser dramática, a figura abaixo mostra o
gasto no primeiro semestre de cada ano desde 1997. Repare que este foi um dos
poucos anos em que ocorreu queda no gasto.
Em todo o período entre 1998 e 2019 o gasto do primeiro semestre
caiu em relação ao primeiro semestre do ano anterior apenas em 1999, 2003, 2015
e 2019. A figura abaixo ilustra a variação do gasto do primeiro semestre em
relação ao primeiro semestre do ano anterior em cada ano. Repare que a queda
deste ano só perde para a de 2003 que continua sendo a maior do período por larga
margem. Se o ajuste deste ano combinado com a reforma da previdência vai
conseguir estabilizar a dívida e ajudar na recuperação da confiança e do investimento
só o tempo dirá, mas sem dúvida foi um esforço importante e necessário que merece
registro.
Para entender a importância da reforma da previdência é
válido dar uma olhada nos principais componentes da despesa primária do
governo. A figura abaixo mostra esses componentes, repare que a previdência (em
vermelho) não apenas é o maior gasto como é o que cresce de forma mais rápida e
mais consistente. As despesas sujeitas a programação financeira, onde estão as
despesas discricionárias, começou a ser ajustada ainda em 2015 quando Dilma
reconheceu a necessidade do ajuste fiscal. Da mesma época começa o controle do
gasto com pessoal, que teve um pulo no governo Temer, mas depois seguiu
estável. Mesmo as despesas obrigatórias começam a ser ajustadas a partir de
2016, repare que a previdência parece estar fora de controle. O objetivo da
reforma é controlar o gasto com previdência, só e tudo isso.
Uma última comparação que faço menos por considerar relevante
e mais porque sempre aparece alguém perguntando diz respeito ao pagamento de
juros. Não considero a comparação relevante porque pagamento de juros na
verdade é pagar por despesas realizadas no passado, por exemplo, parte dos
juros que pagamos diz respeito a gastos com previdência que foram pagos com
empréstimos por falta de recursos para fazer o pagamento na época. Isso vale
para outras despesas. Desta forma quando comparamos juros com alguma despesa
estamos na verdade comparando a antecipação de despesas no passado, inclusive a
que estamos comparando, com a despesa realizada no presente. Considerando o
exemplo da previdência é como se estivéssemos comparando gasto com previdência
no passado com gasto de previdência no presente e não gastos de natureza
diferente como previdência e investimentos. A figura abaixo faz a comparação
que não gosto e mostra o gasto com juros e com previdência no primeiro semestre
de cada ano.
Repare que mesmo a despesa com juros não mostra a tendência de
crescimento observada na despesa com benefícios previdenciários. Depois do pico
de 2015 quando rentistas indignados com o tanto de dinheiro que estavam ganhando
resolveram derrubar o governo para ganhar menos (ridículo, mas tem gente que
acredita) os juros pagos pelo Tesouro tiveram queda e um comportamento oscilatório.
Com a queda da Selic e da inflação é muito provável que o pagamento de juros
siga em uma trajetória de queda nos próximos anos.
O resumo da história é que há um esforço fiscal por parte do
governo e que apenas no primeiro semestre de 2003 foi observado um esforço
maior quando é feita a comparação semestre a semestre. Graças a este esforço o
governo segue uma trajetória de gastos compatível com o teto, o que pode significar
menos tensões no segundo semestre. A combinação da reforma da previdência com a
queda de juros e inflação pode levar a uma estabilização ou mesmo queda na
relação dívida/PIB. É difícil falar em solução do problema fiscal com uma dívida
bruta chegando a 80% do PIB, mas, com as devidas ressalvas, dá para falar que
estamos melhorando no lado fiscal.