Hoje saiu o resultado do PIB de 2017, segundo o IBGE (link
aqui) o PIB cresceu 1% depois de dois anos consecutivos de queda. A pergunta é
se o resultado foi bom, minha resposta é que foi, mas não é uma resposta segura.
Não digo isso apenas porque depois de cair por dois anos seguidos qualquer
crescimento é bom, o que poderia ser um argumento, digo porque os números parecem
mostrar uma recuperação consistente, o que é muito diferente de uma recuperação
rápida. Desde que o Brasil decidiu reviver a década de 70, lá por meados da
década passada, tento alertar dos riscos da experiência. O Brasil não é e não quer
ser China de forma que não deve esperar um crescimento chinês. Nesse sentido
estaria mais preocupado com um crescimento de 5% do que estou com o crescimento
de 1%.
Os números apontam para a recuperação. Se o leitor for ver
os dados do IBGE vai encontrar uma série de medidas de variação do PIB, nas
figuras desse post vou usar apenas as taxas de crescimento acumuladas em quatro
trimestres, faço isso para não ter de discutir efeitos de sazonalidade ou
coisas do tipo. A figura abaixo mostra a taxa de variação do PIB desde de 1996.
A queda que começa no segundo trimestre de 2014 é o retrato da crise. Se olhássemos para a variação no trimestre, não é o que está na figura, veríamos que no
primeiro trimestre de 2014 houve um crescimento de 3,5%, na sequência tivemos
quedas em todos os trimestres até o primeiro de 2017 quando a taxa foi zero, ficando
positiva nos trimestres seguintes.
Em outros posts argumentei que a recuperações rápidas de
crises, como aconteceu em 2009, podem ser sinais que novas crises virão no
futuro próximo, o que parece ser uma recuperação impressionante costuma ser
apenas um adiamento da crise (link
aqui). A comparação entre a recuperação da
queda de 2009 e da queda atual pode ser feita apenas olhando a figura. Ao que
tudo indica não estamos diante de uma nova tentativa de adiar uma crise, pelo contrário.
A impressão que estamos nos recuperando de forma correta
fica reforçada quando olhamos os números que formam o PIB. Comecemos pelo lado
da oferta, a figura abaixo mostra o desempenho da agropecuária, da indústria e
dos serviços entre 1996 e 2017. Aparentemente nossa recuperação é um golpe de
sorte em decorrência do crescimento excepcional da agropecuária, é possível, se
for o caso minha tese da recuperação consistente vai por água abaixo. O
resultado da agropecuária depende muito de eventos climáticos e de fatores
externos, de forma que é difícil relacionar esse crescimento com uma recuperação
da economia como um todo. A indústria, que costuma responder mais a fatores internos,
ficou estacionada em 2017 e os serviços, maior responsável pelo emprego, cresceu
0,3% o que na prática pode ser visto como estagnação. A não recuperação dos
serviços pode ser a causa da não recuperação do emprego na velocidade desejada.
Em resumo, a conclusão da figura abaixo é que o crescimento foi eventual e não mostra
uma recuperação.
Olhando os setores a conclusão é que não temos motivos para
comemorar além do fato que o governo está mais preocupado em arrumar a casa por
meio de reformas do que em forçar o crescimento da economia. Se abrimos mais os
dados a conclusão pode ficar um pouco menos dura. É verdade que o melhor
desempenho na indústria é da extrativa, que também está relacionada a fatores
externos, isso reforça a tese do acaso. Por outro lado, a decomposição do crescimento
entre os setores da indústria permite observar a recuperação da indústria de
transformação. Aqui não posso deixar de registrar que na virada de 2014 para 2015, quando o impeachment ainda não estava na mesa e a economia estava em trajetória de queda, tanto a indústria extrativa quanto a agropecuária mostravam forte crescimento o que é uma forte evidência contra a tese que culpa as commodities por nossa crise.
Se olharmos as taxas trimestrais, que não estão na figura, a indústria
de transformação cresceu 6% no quarto trimestre de 2017, contra queda de 3,4%
no quarto trimestre de 2016, queda de 11,5% no quarto trimestre de 2015 e queda
de 6% no quarto trimestre de 2014. Mesmo em 2010, nosso ano de maior
crescimento nas últimas décadas, a indústria de transformação não cresceu tanto
no quarto trimestre, naquele ano a indústria, que chegou a crescer 15,9% no
primeiro trimestre, cresceu 3,4% entre outubro e dezembro.
Quem está segurando a recuperação da indústria como um todo
é a construção. Repare que ao contrário da indústria de transformação a indústria
da construção não mostra um padrão de recuperação. O lado ruim disso é que o encolhimento da construção dificulta o crescimento do emprego com impacto em mão
de obra não qualificada, pessoal que sofre nas crises. O lado positivo é que
esse setor cresceu muito no período anterior a crise, na época se falou de bolha da construção civil, e precisava mesmo passar por um ajuste. Outro
ponto positivo é que o governo está se controlando em estimular a indústria da
construção, ou seja, o governo não está adiando o ajuste do setor. Se o governo
vai se manter na linha em ano eleitoral é coisa que não sei dizer, programas de
incentivo a construção fazem a alegria da classe média que sonha com casa
própria, dos pobres que conseguem empregos nas obras e dos ricos que são donos
das construtoras, entretanto, crescimento artificial nesse setor cria bolhas
que podem ser desastrosas como o mundo viu em 2008 na crise que começou no
setor de construção dos EUA. O ajuste da construção é um remédio amargo que
deve ser tomado para evitar problemas maiores no futuro próximo.
A construção não apenas esconde a recuperação da indústria,
esconde também a recuperação do investimento. A figura abaixo mostra as taxas
de variação do consumo das famílias, do consumo do governo e do investimento.
Como é possível ver o menor ajuste foi no consumo do governo, depois o consumo
das famílias e o grande ajuste foi no investimento que continua com taxa de
variação negativa, a queda foi de 1,8%. Entretanto, se abrimos os números, é
possível ver que o item “máquinas e equipamentos” cresceu 3% contra uma queda
de 5,6% no item “construção”. Como construção responde pela maior parte do
investimento, em 2017 foi 52,25 contra 32,95 de máquinas e equipamentos, o
resultado final foi de queda, mas a recuperação do investimento em máquinas e
equipamentos é relevante, principalmente quando observamos que esse tipo de
investimento teve queda de 7% em 2014, 22,3% em 2015 e 15,6% em 2016. Outro
aspecto relevante é que o aumento do investimento em máquinas e equipamentos
ocorreu em um período de queda dos desembolsos do BNDES, o que sugere tratar-se
de uma recuperação de fato e não de um movimento artificial.
Um último aspecto a ser analisado é o setor externo, a
figura abaixo mostra a taxa de variação das exportações e importações. Depois da
queda nas importações e aumento das exportações, fenômeno razoável em época de
crise onde famílias compram menos e empresas buscam mercados externos para
compensar a queda nas vendas locais, observamos nos últimos trimestres um
aumento simultâneo das exportações e importações. A figura não mostra, mas o
saldo comercial foi positivo em 2017, o que também não quer dizer muita coisa.
A análise imediata dos números do PIB sugere uma
recuperação, afinal paramos de encolher e voltamos a crescer, mesmo que pouco. Uma análise com
um pouco mais de cuidado acende uma luz amarela, agropecuária e indústria
extrativa, os setores com melhor desempenho, dependem mais fatores como mercado
externo e clima do que de reformas e fundamentos sólidos na economia, reforça o
sinal de alerta a queda no investimento. Aprofundando um pouquinho mais podemos
ver sinais de uma recuperação consistente, a indústria de transformação voltou
a crescer e o investimento em máquinas e equipamentos também cresceu. Tanto a estagnação
da indústria quanto a queda do investimento são explicadas pela crise na
construção civil.