O jornal Washington Post fez um texto interessante para
questionar afirmações de Peter Navarro, assessor de Trump, dizendo que os EUA
possuem as menores tarifas do mundo (link aqui). A conclusão do jornal é que as
tarifas nos Estados Unidos estão entre as mais baixas, mas que dizer que são as
mais baixas do mundo é ir muito longe. Resolvi pegar carona no artigo e olhar
com mais cuidados os dados de tarifa do Banco Mundial e ver onde se enquadra os
Estados Unidos. O artigo do Washington Post cita os dados que vou usar, mas a
análise deles é centrada nos dados da Organização Mundial do Comércio que incluem
barreiras não tarifárias. Além de divertido o exercício ilustra mais uma vez os
perigos de comparar países ricos com países emergentes.
A medida de tarifa usada no post será a média ponderada das
tarifas aplicadas por cada país no período que vai de 2011 a 2015, a ponderação
é feita pela quantidade importada de cada produto. Comecemos comparando os
Estados Unidos com a OCDE e grupos de países definidos pela renda de acordo com
a classificação do Banco Mundial (link aqui). Os dados estão na figura abaixo,
repare que de fato as tarifas médias nos Estados Unidos são mais baixas que em
todos os grupos, inclusive o grupo dos países de renda alta e a OCDE. Desta
forma está justificada a conclusão que os Estados Unidos possuem tarifas
baixas. Note também que existem saltos entre as tarifas dos diversos grupos de
países, o que ilustra os riscos de comparar países de grupos diferentes. Lembre
disso quando comparar as tarifas dos EUA com as do Brasil, para ser mais claro:
o Brasil não é referência para os Estados Unidos.
Para comparar os Estados Unidos com outros países ricos selecionei
esse grupo de países e excluí os que possuem menos de dez milhões de
habitantes. O procedimento me deixou com dezoito países, porém onze são países
europeus que possuem as mesmas tarifas. Para não carregar a figura com dados
redundantes juntei esses países com o rótulo “Países da Europa”. A figura
abaixo mostra o resultado, repare que os Estados Unidos estão no meio da lista,
abaixo da Coreia do Sul, Arábia Saudita, Chile e Austrália e acima dos Países
da Europa, Japão e Canadá. A conclusão é que os dados do Banco Mundial reforçam
a conclusão do Washington Post: as tarifas dos Estados Unidos são baixas, mas
não dá para dizer que são as mais baixas do mundo.
E se fizermos o mesmo exercício para o Brasil? Na semana passada
tanto o Banco Mundial quanto a Secretaria de Assuntos Estratégicos da
Presidência da República (SAE/PR) lançaram documentos recomendando que o Brasil
abra mais a economia (link aqui e aqui). Os dados do Banco Mundial suportam a
tese que a economia brasileira é fechada? A figura abaixo mostra as tarifas no
Brasil comparadas com as dos mesmos grupos de renda de países usados para os
Estados Unidos e com América Latina e Caribe no lugar da OCDE. Reparem que no
Brasil a tarifa média está acima do grupo de países de renda média-alta, grupo
onde o Banco Mundial classifica o Brasil, também está acima da média da América
Latina e Caribe, de fato nossas tarifas só perdem para a média dos países de
renda baixa.
A comparação no grupo de países não nos deixa em situação melhor.
Aplicado o mesmo procedimento usado para os Estados Unidos, países do mesmo
grupo com mais de dez milhões de habitantes, fiamos com a terceira tarifa mais
alta, na “nossa frente” estão apenas Irã e Venezuela. Logo abaixo do Brasil
aparece Argélia e depois Cuba, sim o Brasil tarifa mais do que Cuba. Nossa tarifa
média de 8,34% está acima da observada na Rússia, 5,34%, e na China, 3,4%. Se
considerarmos os países da América do Sul a Argentina aparece com 6,39%, seguida
do Equador, 4,82%, Colômbia, 4,67% e Peru, 2,93%. No México a tarifa média é de
4,12%, menos da metade da nossa. Se alguém ficou curioso com Cuba nos países de
renda média-alta eu informo que também desconfio do dado, é fato conhecido que
dados oficiais de ditaduras são suspeitos. O Banco Mundial, uma organização
multilateral, não pode destoar muito dos dados oficiais, não sei o Banco Mundial
pode fazer como o FMI e excluir Cuba das bases de dados e, mesmos e puder, não
sei se seria a melhor estratégia. Quem estiver interessado em estimativas não oficiais
para a renda média de Cuba recomendo os dados do Projeto Maddison que usei em
post sobre Cuba (link aqui).
Os dados para os Estados Unidos mostram um país com tarifas
baixas, porém maiores do que afirmam os propagandistas do aumento de tarifas na
terra da liberdade. Para o Brasil o recado é que destoamos dos países do nosso
grupo em relação a tarifas, somos um país de renda média-alta com tarifas de
país pobre. O resultado que o Brasil é mais fechado do que deveria ser aparece
com outras medidas de abertura, em setembro de 2016 outro post do blog chegou a
conclusões semelhantes quanto a abertura no Brasil usando dados de exportação e
importação(link aqui). Podemos continuar criticando métricas e justificando porque somos
diferentes ou aproveitar o embalo dos relatórios do Banco Mundial e da SAE/PR
para começarmos a abrir nossa economia. Não precisamos nos inspirar em países
com fama liberais, na situação atual reduzir nossas tarifas para o nível de
Cuba já seria um avanço, ou, ironias à parte, podemos tentar chegar na média dos
países de renda média-alta ou quem sabe no nível da China comunista...
desculpem, não resisti.
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