O IBGE divulgou as contas nacionais referentes ao terceiro
trimestre de 2021 (link aqui). A recuperação da queda causada pela Coviv-19 no
primeiro semestre de 2019 continua perdendo fôlego. Em relação ao trimestre
anterior o PIB teve uma queda de 0,1%, o resultado traz dúvidas pertinentes a
respeito do desempenho da economia.
O índice de PIB com ajuste sazonal chegou a 171,8 no primeiro
trimestre de 2021 contra 171,3 no quarto trimestre de 2019 o que caracterizou a
recuperação em “V”, porém nos trimestres seguintes houve queda, 171,2 no segundo
e 171,2 no terceiro trimestre deste ano. A dinâmica da economia brasileira fica
cada vez mais parecida com a esperada após um choque negativo de oferta, queda
do PIB e aumento no nível de preços. Nesse caso as políticas de expansão da :demanda,
especialmente no caso da política monetária, são pouco úteis para estimular a
economia, porém são fatais para o controle da inflação.
A figura abaixo mostra o crescimento da economia desde 1996, as barras mostram o crescimento em relação ao trimestre anterior (com ajuste sazonal) e a linha mostra o crescimento acumulado em quatro trimestres. No acumulado houve um crescimento de 3,9%, o número reflete o forte crescimento do final de 2020.que refletia a recuperação da grande queda do primeiro semestre e não mudanças estruturais da economia brasileira.
Como é tradição no blog a análise será feita pelo lado da
produção. A análise da despesa, preferida por vários colegas de profissão, é
interessante para entender como foi a distribuição do PIB. A figura
abaixo mostra o crescimento dos grandes setores da economia. No acumulado de
quatro trimestres a agropecuária, que no terceiro trimestre de 2021 respondeu
por6,6% do valor agregado e 5,6% do PIB, cresceu 0,2%; o setor de serviços, 69,2%%
do valor agregado e 58,8% do PIB, cresceu 3,3%; finalmente, a indústria, que
responde por 24,2% do valor agregado e 20,6% do PIB, cresceu 5,1%. Na
comparação com o trimestre anterior a agropecuária teve queda de 8,0%, a
indústria ficou estagnada e nos serviços o crescimento foi de 1,1%. A forte
queda da agropecuária, relacionada à crise hídrica, é o destaque no comportamento
do PIB, porém a estagnação da indústria, após queda no segundo trimestre, reforça
a tese de perda de folego da recuperação da economia.
Analisando a desempenho de setores da indústria é possível perceber que no acumulado de quatro trimestres a construção cresceu 5,6% e a indústria de transformação cresceu 5,1%, esses números devem ter lido tendo em mente a recuperação do final de 2020. A indústria extrativa cresceu 0,2%. Na comparação com o trimestre anterior a construção cresceu 3,9%, a indústria teve queda de 0,4% e a indústria de transformação teve queda de 1%. No terceiro trimestre de 2021 a indústria extrativa correspondeu a 26,6% da indústria total, a construção por 10,8% e a de transformação por 51,5%. Não fosse o grande crescimento da construção o setor de indústria também teria tido queda, isso é preocupante porque o crescimento da construção pode estar associado a distorções como os juros (que ainda estã0) baixos e ações de bancos estatais.
No acumulado de quatro trimestres o
consumo das famílias cresceu 2,1% e o consumo do governo, não confundir com o
gasto do governo, cresceu 0,4%. As exportações cresceram3,8% e as importações 10,3%.
Na comparação com o trimestre anterior o consumo das famílias cresceu 0,9%l, o
consumo do governo cresceu 0,8%, as exportações e as importações caíram 9,8% e
8,3%, respectivamente.
Os números das contas nacionais mostram que a pandemia do coronavírus interrompeu o processo de lenta recuperação que vínhamos seguindo desde 2017, mas que ocorreu uma boa recuperação em relação a queda causada pela pandemia. Os números do segundo e do terceiro trimestre de 2021 sugerem que acabou o fôlego da recuperação e que estamos entrando em uma dinâmica de estagnação ou coisa pior.
Nos últimos posts sobre contas nacionais registrei os riscos
da inflação, o que era risco agora é fato com a expectativa da inflação medida
pelo IPCA acima de 10% para este ano. A dinâmica de um choque de oferta é muito
diferente da dinâmica de uma crise associada à retração da demanda agregada. A
queda do produto deixa de ser vista como um aumento do hiato entre produto
observado e produto potencial, que teoricamente pode ser resolvido com
estímulos à demanda, e passa a ser lida como uma queda do produto potencial,
pelo menos no curto prazo. Mais adequado seria entender que o produto é
condicionado ao choque de oferta, de forma que um choque negativo reduz o
produto sem que isso signifique um crescimento do hiato.
A devida compreensão da natureza do choque é fundamental para
evitar a insistência em políticas de expansão da demanda que só levam à
aceleração da inflação. Dado que o controle da política fiscal é muito difícil
pela fragilidade política do governo (estou sendo generoso ao supor que o
governo deseja um ajuste fiscal) e proximidade do ano eleitoral resta ao BC
acionar o freio antes que seja tarde demais.