quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

Conta Nacionais o terceiro trimestre de 2021: estagnação com inflação.

O IBGE divulgou as contas nacionais referentes ao terceiro trimestre de 2021 (link aqui). A recuperação da queda causada pela Coviv-19 no primeiro semestre de 2019 continua perdendo fôlego. Em relação ao trimestre anterior o PIB teve uma queda de 0,1%, o resultado traz dúvidas pertinentes a respeito do desempenho da economia.

O índice de PIB com ajuste sazonal chegou a 171,8 no primeiro trimestre de 2021 contra 171,3 no quarto trimestre de 2019 o que caracterizou a recuperação em “V”, porém nos trimestres seguintes houve queda, 171,2 no segundo e 171,2 no terceiro trimestre deste ano. A dinâmica da economia brasileira fica cada vez mais parecida com a esperada após um choque negativo de oferta, queda do PIB e aumento no nível de preços. Nesse caso as políticas de expansão da :demanda, especialmente no caso da política monetária, são pouco úteis para estimular a economia, porém são fatais para o controle da inflação.

A figura abaixo mostra o crescimento da economia desde 1996, as barras mostram o crescimento em relação ao trimestre anterior (com ajuste sazonal) e a linha mostra o crescimento acumulado em quatro trimestres. No acumulado houve um crescimento de 3,9%, o número reflete o forte crescimento do final de 2020.que refletia a recuperação da grande queda do primeiro semestre e não mudanças estruturais da economia brasileira.


Como é tradição no blog a análise será feita pelo lado da produção. A análise da despesa, preferida por vários colegas de profissão, é interessante para entender como foi a distribuição do PIB. A figura abaixo mostra o crescimento dos grandes setores da economia. No acumulado de quatro trimestres a agropecuária, que no terceiro trimestre de 2021 respondeu por6,6% do valor agregado e 5,6% do PIB, cresceu 0,2%; o setor de serviços, 69,2%% do valor agregado e 58,8% do PIB, cresceu 3,3%; finalmente, a indústria, que responde por 24,2% do valor agregado e 20,6% do PIB, cresceu 5,1%. Na comparação com o trimestre anterior a agropecuária teve queda de 8,0%, a indústria ficou estagnada e nos serviços o crescimento foi de 1,1%. A forte queda da agropecuária, relacionada à crise hídrica, é o destaque no comportamento do PIB, porém a estagnação da indústria, após queda no segundo trimestre, reforça a tese de perda de folego da recuperação da economia.

 

Analisando a desempenho de setores da indústria é possível perceber que no acumulado de quatro trimestres a construção cresceu 5,6% e a indústria de transformação cresceu 5,1%, esses números devem ter lido tendo em mente a recuperação do final de 2020. A indústria extrativa cresceu 0,2%. Na comparação com o trimestre anterior a construção cresceu 3,9%, a indústria teve queda de 0,4% e a indústria de transformação teve queda de 1%. No terceiro trimestre de 2021 a indústria extrativa correspondeu a 26,6% da indústria total, a construção por 10,8% e a de transformação por 51,5%. Não fosse o grande crescimento da construção o setor de indústria também teria tido queda, isso é preocupante porque o crescimento da construção pode estar associado a distorções como os juros (que ainda estã0) baixos e ações de bancos estatais. 


Nos serviços o destaque foi da “Informação e comunicação“, cresceu 9,6% no acumulado de quatro trimestres, “Transporte, armazenagem e correio”, 8%, e “Comércio”, 7,1%. Administração, defesa, saúde e educação públicas e seguridade social teve crescimento de 0,07%. A figura abaixo mostra o crescimento no setor de serviços. Na comparação com o trimestre anterior todos os setores que compõem os serviços apresentaram crescimento. A recuperação do setor de serviços é particularmente importante para a redução do desemprego. 


Por fim, passemos a análise pelo lado da demanda, ou seja, como foi distribuída a produção do país. O investimento, a parte do produto destinada a criar mais produto no futuro, cresceu 20,2% no acumulado em quatro trimestres. Na comparação com o trimestre anterior o investimento caiu 0,1%. O forte crescimento no acumulado de quatro trimestres e a queda na comparação com o trimestre anterior é mais um sinal de que a recuperação teve pernas curtas e está mais associada à queda de primeiro semestre de 2020 do que a mudanças estruturais.

No acumulado de quatro trimestres o consumo das famílias cresceu 2,1% e o consumo do governo, não confundir com o gasto do governo, cresceu 0,4%. As exportações cresceram3,8% e as importações 10,3%. Na comparação com o trimestre anterior o consumo das famílias cresceu 0,9%l, o consumo do governo cresceu 0,8%, as exportações e as importações caíram 9,8% e 8,3%, respectivamente.


Os números das contas nacionais mostram que a pandemia do coronavírus interrompeu o processo de lenta recuperação que vínhamos seguindo desde 2017, mas que ocorreu uma boa recuperação em relação a queda causada pela pandemia. Os números do segundo e do terceiro trimestre de 2021 sugerem que acabou o fôlego da recuperação e que estamos entrando em uma dinâmica de estagnação ou coisa pior.

Nos últimos posts sobre contas nacionais registrei os riscos da inflação, o que era risco agora é fato com a expectativa da inflação medida pelo IPCA acima de 10% para este ano. A dinâmica de um choque de oferta é muito diferente da dinâmica de uma crise associada à retração da demanda agregada. A queda do produto deixa de ser vista como um aumento do hiato entre produto observado e produto potencial, que teoricamente pode ser resolvido com estímulos à demanda, e passa a ser lida como uma queda do produto potencial, pelo menos no curto prazo. Mais adequado seria entender que o produto é condicionado ao choque de oferta, de forma que um choque negativo reduz o produto sem que isso signifique um crescimento do hiato.

A devida compreensão da natureza do choque é fundamental para evitar a insistência em políticas de expansão da demanda que só levam à aceleração da inflação. Dado que o controle da política fiscal é muito difícil pela fragilidade política do governo (estou sendo generoso ao supor que o governo deseja um ajuste fiscal) e proximidade do ano eleitoral resta ao BC acionar o freio antes que seja tarde demais.

  

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