quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Desembolsos do BNDES e Investimento: Mais um Diagnóstico Errado Induzindo um Tratamento Errado.

Reportagem de O Globo informa que os desembolsos do BNDESpodem chegar a R$ 190 bilhões este ano. A se confirmar este número o BNDES terá aumentado seus desembolsos quase 22% em relação a 2012, no mesmo período o PIB deve crescer menos de 2%. O fato que os desembolsos do BNDES têm crescido de forma significativa nos últimos anos. A figura abaixo mostra os desembolsos do BNDES desde 1997. Entre 1997 e 2012 os desembolsos do BNDES aumentaram 716,75%, no mesmo período o PIB aumentou 368,78% e o investimento aumentou 389,59%, tudo em valores correntes. O resultado é que os desembolsos do BNDES passaram de 2,0% do PIB em 1997 para 3,5% em 2012, o valor máximo do período foi de 4,5% do PIB em 2010.




O discurso oficial é que é preciso estimular o investimento, o fato dos desembolsos do BNDES terem crescido muito mais do que o investimento sugere cautela com este discurso. Vou começar sendo extremamente favorável ao argumento do governo e supor que toda a variação no investimento é devida a variações nos desembolsos do BNDES. Neste caso a maneira de medir o efeito dos gastos do BNDES sobre o investimento seria calcular a razão entre a variação no investimento e a variação nos gastos do BNDES. Fiz isto para todos os anos entre 1997 e 2012, a média de todos os anos deu 1,86. Desta forma podemos dizer que para cada aumento de R$ 1,00 nos desembolsos do BNDES o investimento aumenta em R$ 1,86, ou ainda, os empresários colocam 86 centavos de investimento para cada um real que o governo os empresta para investir. Parece um efeito multiplicador muito pequeno para justificar tanto gasto.

Mas a hipótese que as variações no investimento decorrem de variações nos gastos do BNDES é forte, fiz um pequeno e apressado teste estatístico para checar se esta é uma hipótese razoável. Em uma regressão da variação da taxa de investimento contra a variação dos desembolsos do BNDES como proporção do PIB obtive um coeficiente não significativo dos desembolsos do BNDES como proporção do PIB. Dito de outra forma, as variações dos desembolsos do BNDES em proporção ao PIB não parecem ter efeito significativo sobre as variações da taxa de investimento. A figura abaixo mostra a taxa de investimento, azul claro, e o desembolso do BNDES em relação ao PIB. Note que o segundo cresce muito mais que o primeiro.




Qual razão dos desembolsos do BNDES não terem um impacto multiplicador significativo sobre o investimento? Existem várias respostas para esta pergunta. Uma linha de raciocínio é imaginar que o BNDES empresta dinheiro usando mais critérios políticos do que técnicos, assim em vez de emprestar para empresas com bons projetos o BNDES acaba emprestando para empresas próximas aos governantes de plantão. Um bom teste para esta hipótese é calcular a correlação entre o volume de empréstimos que a empresa consegue junto ao BNDES e as doações que a empresa fez para a campanha da coligação que ganhou as eleições federais. Outra possibilidade é que o BNDES esteja resolvendo um problema que não existe. Apesar do apelo da primeira hipótese, principalmente em tempos de Mensalão e congêneres, a segunda hipótese me parece mais pertinente. Antes deseguir adiante recomendo a leitura do artigo de Sérgio G. Lazzarini, AldoMusacchio, Rodrigo Bandeira-de-Mello e Rosilene Marcon sobre a atuação doBNDES. Destaco aqui a última frase do abstract do paper: “In general, BNDES appears to be generally selecting firms with capacity to repay their loans, as regular commercial banks would do”.

Este é o que considere o ponto central para explicar porque os desembolsos do BNDES não criaram uma expansão equivalente no investimento e no crescimento do Brasil. Existem vários motivos que levam uma firma a não investir, um deles é a falta de acesso ao mercado financeiro. O empresário tem um bom projeto, quer investir, mas não encontra ninguém que financie o projeto.  Se este fosse o problema das empresas beneficiadas pelo BNDES certamente a história teria sido outra. Ocorre que falta de acesso ao crédito é apenas uma das possíveis razões para uma empresa não investir. Acredito que hoje o maior problema do Brasil não seja este, pode até ter sido nas décadas de 1950 a 1970, mas não é mais. As empresas não investem no Brasil porque o ambiente de negócios no Brasil é muito ruim. Noranking do Banco Mundial que classifica os países por facilidade de fazer negócioso Brasil aparece na 130º posição, atrás de Bangladesh, Indonésia e Etiópia!

As empresas não deixam de investir no Brasil por falta de financiamento, deixam de investir porque a dificuldade de fazer negócios torna mais rentável investir em outros lugares. Ao beneficiar empresas específicas o BNDES piora ainda mais a situação. Quem vai investir no Brasil se pode acabar tendo de concorrer com empresas fortemente subsidiadas?

Se o Brasil quer voltar a crescer é melhor usar estes R$ 190 bilhões em infraestrutura, melhora do capital humano e investir pesado em melhorar o ambiente de negócios. Desperdiçar bilhões de reais na solução de um não-problema pode ser o caminho para uma próxima década perdida.

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