O IBGE divulgou as contas nacionais referentes ao primeiro trimestre de 2021 (link aqui). A recuperação da queda causada pela Coviv-19 no primeiro semestre de 2019 aparece nos números do PIB. Em relação ao trimestre anterior o PIB cresceu 1,2%, o crescimento faz parte do mesmo movimento que levou à queda recorde de 9,6% no segundo trimestre de 2020 e ao crescimento, também recorde, de 7,7% no terceiro trimestre daquele ano.
Assim como nos trimestres anteriores, o crescimento do
primeiro trimestre de 2021 dificilmente pode ser analisado na perspectiva da
dinâmica de crise e recuperação que costumo usar nos posts sobre contas
nacionais. O máximo que pode ser feito é entender como será a recuperação da
crise causada pela pandemia e tentar especular sobre como esta recuperação pode
afetar a dinâmica da economia brasileira na ótica das contas nacionais.
A figura abaixo mostra o crescimento da economia desde 1996, as
barras mostram o crescimento em relação ao trimestre anterior (com ajuste
sazonal) e a linha mostra o crescimento acumulado em quatro trimestres. No
acumulado houve uma queda 3,8%, o que mostra que, apesar do crescimento nos
últimos trimestres, a crise do Covid-19 ainda não está no retrovisor.
Como é tradição no blog a análise será feita pelo lado da
produção. A análise da despesa, preferida por vários colegas de profissão, é
interessante para entender como foi a distribuição do PIB. A figura
abaixo mostra o crescimento dos grandes setores da economia. No acumulado de
quatro trimestres a agropecuária, que no primeiro trimestre de 2021 respondeu
por 11,9% do valor agregado e 10,2% do PIB, cresceu 2,3%; o setor de serviços, 68,2%%
do valor agregado e 58,4% do PIB, teve uma queda de 4,5%; finalmente, a
indústria, que responde por 19,9% do valor agregado e 17% do PIB, teve uma
queda de 2,7%. Na comparação com o trimestre anterior a agropecuária teve crescimento
de 5,7%, a indústria teve crescimento de 0,7% e nos serviços o crescimento foi 0,4%.
O forte crescimento da agropecuária, que atingiu recorde em participação no
PIB, explica boa parte do crescimento no primeiro trimestre de 2021.
No acumulado de quatro trimestres a construção teve
queda de 6,9%. Na indústria de transformação a queda foi de 2,7%. Ao contrário
de outros períodos quando a queda na indústria de transformação podia ser vista
como parte da arrumação de casa após a sequência de investimentos
questionáveis, para dizer o mínimo, da primeira metade da década., esta queda ainda
reflete o impacto da pandemia no setor A indústria extrativa teve queda de 0,3%.
Na comparação com o trimestre anterior a construção cresceu 2,1%, a indústria
extrativa cresceu 3,2% e a indústria de transformação teve queda de 0,5%. No primeiro
trimestre de 2021 a indústria extrativa correspondeu a 21,5% da indústria total,
a construção por 13,1% e a de transformação por 51,9%. Os números mostram que a
indústria extrativa foi fundamental para o resultado positivo do trimestre.
Nos serviços o maior crescimento ficou por conta do setor de atividades
financeiras, de seguros e serviços relacionados que cresceu 5% no acumulado de
quatro trimestres, também houve crescimento de 3% nas atividades imobiliárias.
Administração, defesa, saúde e educação públicas e seguridade social teve queda
de 5,5%., as maiores quedas foram de 8,6% no setor de transportes e 13% em
outras atividades de serviços A figura abaixo mostra o crescimento no setor de
serviços. Na comparação com o trimestre anterior apenas o setor “Administração,
defesa, saúde e educação públicas e seguridade social” registrou queda Mais uma
vez o crescimento faz parte do mesmo movimento que causou a queda no trimestre
anterior.
Por fim, passemos a análise pelo
lado da demanda, ou seja, como foi distribuída a produção do país. O
investimento, a parte do produto destinada a criar mais produto no futuro, cresceu
2% no acumulado em quatro trimestres. Na comparação com o trimestre anterior o
investimento cresceu 4,6. O crescimento do investimento costuma ser um
importante sinalizador para recuperação da economia, mas nunca é demais lembrar
que é preciso analisar a qualidade do investimento.
O consumo das famílias e do governo
caíram 5,7% no acumulado de quatro trimestres. As exportações caíram 1% e as
importações caíram 9,2%. Na comparação com o trimestre anterior o consumo das
famílias caiu 0,1%, o consumo do governo caiu 0,8%, as exportações cresceram 3,7%
e as importações tiveram aumento de 11,6%.
Os números das contas nacionais mostram que a pandemia do coronavírus interrompeu o processo de lenta recuperação que vínhamos seguindo desde 2017, mas sugerem uma boa recuperação em relação a queda causada pela própria pandemia. Essa recuperação pode ser comprometida pelo recrudescimento da pandemia. De fato, o comportamento da economia depende essencialmente dos rumos da pandemia. Sem uma campanha de vacinação em massa só um milagre pode nos tirar da crise.
O crescimento do trimestre veio acima do esperado, a
agropecuária e a indústria extrativa tiveram um forte papel neste resultado.
Isso sugere que o bom resultado pode estar mais associado à dinâmica do resto
do mundo, visto que os dois setores são exportadores de commodities, do que à
dinâmica da economia interna. Não que tal dependência seja ruim ou mesmo um
problema, mas é uma característica que merece registro.
Para ter crescimento de longo prazo o governo precisaria liderar
uma sólida agenda de reformas, nesse sentido ao trocar a agenda de abertura
pela necessidade de proteger o patrimônio da indústria é um péssimo sinal. Continua
valendo que se o governo partir para políticas de estímulos turbinadas por
planos como o Pró-Brasil, Casa Verde e Amarela e uso de estatais podemos até
ter bons números no curto prazo, ainda assim condicionados à dinâmica da
pandemia, mas começaremos outra caminhada em direção ao abismo. A disparada dos
preços no atacado, levando junto o IGP-M, mostra que, além da recuperação do
PIB, o governo deve se preocupar em evitar que a inflação que já atinge os
preços aos consumidores.
P.S. Os gráficos setoriais não são os ideais, continuo
procurando uma forma melhor de passar os desempenhos dos setores sem abrir mão
de grande parte da série.
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