terça-feira, 1 de junho de 2021

Contas Nacionais no Primeiro Trimestre de 2021: Agropecuária, Indústria Extrativa e o Resto.

O IBGE divulgou as contas nacionais referentes ao primeiro trimestre de 2021 (link aqui). A recuperação da queda causada pela Coviv-19 no primeiro semestre de 2019 aparece nos números do PIB. Em relação ao trimestre anterior o PIB cresceu 1,2%, o crescimento faz parte do mesmo movimento que levou à queda recorde de 9,6% no segundo trimestre de 2020 e ao crescimento, também recorde, de 7,7% no terceiro trimestre daquele ano.

Assim como nos trimestres anteriores, o crescimento do primeiro trimestre de 2021 dificilmente pode ser analisado na perspectiva da dinâmica de crise e recuperação que costumo usar nos posts sobre contas nacionais. O máximo que pode ser feito é entender como será a recuperação da crise causada pela pandemia e tentar especular sobre como esta recuperação pode afetar a dinâmica da economia brasileira na ótica das contas nacionais.

A figura abaixo mostra o crescimento da economia desde 1996, as barras mostram o crescimento em relação ao trimestre anterior (com ajuste sazonal) e a linha mostra o crescimento acumulado em quatro trimestres. No acumulado houve uma queda 3,8%, o que mostra que, apesar do crescimento nos últimos trimestres, a crise do Covid-19 ainda não está no retrovisor. 


 

Como é tradição no blog a análise será feita pelo lado da produção. A análise da despesa, preferida por vários colegas de profissão, é interessante para entender como foi a distribuição do PIB. A figura abaixo mostra o crescimento dos grandes setores da economia. No acumulado de quatro trimestres a agropecuária, que no primeiro trimestre de 2021 respondeu por 11,9% do valor agregado e 10,2% do PIB, cresceu 2,3%; o setor de serviços, 68,2%% do valor agregado e 58,4% do PIB, teve uma queda de 4,5%; finalmente, a indústria, que responde por 19,9% do valor agregado e 17% do PIB, teve uma queda de 2,7%. Na comparação com o trimestre anterior a agropecuária teve crescimento de 5,7%, a indústria teve crescimento de 0,7% e nos serviços o crescimento foi 0,4%. O forte crescimento da agropecuária, que atingiu recorde em participação no PIB, explica boa parte do crescimento no primeiro trimestre de 2021.

 


No acumulado de quatro trimestres a construção teve queda de 6,9%. Na indústria de transformação a queda foi de 2,7%. Ao contrário de outros períodos quando a queda na indústria de transformação podia ser vista como parte da arrumação de casa após a sequência de investimentos questionáveis, para dizer o mínimo, da primeira metade da década., esta queda ainda reflete o impacto da pandemia no setor A indústria extrativa teve queda de 0,3%. Na comparação com o trimestre anterior a construção cresceu 2,1%, a indústria extrativa cresceu 3,2% e a indústria de transformação teve queda de 0,5%. No primeiro trimestre de 2021 a indústria extrativa correspondeu a 21,5% da indústria total, a construção por 13,1% e a de transformação por 51,9%. Os números mostram que a indústria extrativa foi fundamental para o resultado positivo do trimestre.

 


Nos serviços o maior crescimento ficou por conta do setor de atividades financeiras, de seguros e serviços relacionados que cresceu 5% no acumulado de quatro trimestres, também houve crescimento de 3% nas atividades imobiliárias. Administração, defesa, saúde e educação públicas e seguridade social teve queda de 5,5%., as maiores quedas foram de 8,6% no setor de transportes e 13% em outras atividades de serviços A figura abaixo mostra o crescimento no setor de serviços. Na comparação com o trimestre anterior apenas o setor “Administração, defesa, saúde e educação públicas e seguridade social” registrou queda Mais uma vez o crescimento faz parte do mesmo movimento que causou a queda no trimestre anterior.

 


Por fim, passemos a análise pelo lado da demanda, ou seja, como foi distribuída a produção do país. O investimento, a parte do produto destinada a criar mais produto no futuro, cresceu 2% no acumulado em quatro trimestres. Na comparação com o trimestre anterior o investimento cresceu 4,6. O crescimento do investimento costuma ser um importante sinalizador para recuperação da economia, mas nunca é demais lembrar que é preciso analisar a qualidade do investimento.

O consumo das famílias e do governo caíram 5,7% no acumulado de quatro trimestres. As exportações caíram 1% e as importações caíram 9,2%. Na comparação com o trimestre anterior o consumo das famílias caiu 0,1%, o consumo do governo caiu 0,8%, as exportações cresceram 3,7% e as importações tiveram aumento de 11,6%.

 


Os números das contas nacionais mostram que a pandemia do coronavírus interrompeu o processo de lenta recuperação que vínhamos seguindo desde 2017, mas sugerem uma boa recuperação em relação a queda causada pela própria pandemia. Essa recuperação pode ser comprometida pelo recrudescimento da pandemia. De fato, o comportamento da economia depende essencialmente dos rumos da pandemia. Sem uma campanha de vacinação em massa só um milagre pode nos tirar da crise.

O crescimento do trimestre veio acima do esperado, a agropecuária e a indústria extrativa tiveram um forte papel neste resultado. Isso sugere que o bom resultado pode estar mais associado à dinâmica do resto do mundo, visto que os dois setores são exportadores de commodities, do que à dinâmica da economia interna. Não que tal dependência seja ruim ou mesmo um problema, mas é uma característica que merece registro.

Para ter crescimento de longo prazo o governo precisaria liderar uma sólida agenda de reformas, nesse sentido ao trocar a agenda de abertura pela necessidade de proteger o patrimônio da indústria é um péssimo sinal. Continua valendo que se o governo partir para políticas de estímulos turbinadas por planos como o Pró-Brasil, Casa Verde e Amarela e uso de estatais podemos até ter bons números no curto prazo, ainda assim condicionados à dinâmica da pandemia, mas começaremos outra caminhada em direção ao abismo. A disparada dos preços no atacado, levando junto o IGP-M, mostra que, além da recuperação do PIB, o governo deve se preocupar em evitar que a inflação que já atinge os preços aos consumidores.

 

P.S. Os gráficos setoriais não são os ideais, continuo procurando uma forma melhor de passar os desempenhos dos setores sem abrir mão de grande parte da série.

 

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