Vez por outra leio textos de economistas dentro e fora a do
governo apontando a confiança como o motor da economia. Sem confiança estamos
destinados a estagnação, com confiança o céu é o limite. Como em um passe de
mágica a confiança faz com que empresários decidam investir mais aumentando a
produção e criando novos empregos, a mesma confiança faz com que os
consumidores gastem mais garantindo a demanda necessária para o aumento de
produção, mas fica melhor, com o aumento da produção, do emprego e dos gastos o
governo arrecada mais e presta melhores serviços à população. É claro que em
uma sociedade onde a produção aumenta, a demanda acompanha o aumento da
produção, empregos são criados e os serviços públicos não param de melhorar a
confiança cresce ainda mais e ciclo virtuoso se estabelece. Confiança gera
prosperidade que gera ainda mais confiança.
Sendo assim a saída para tirar uma economia de uma crise é
reestabelecer a confiança. Paul Krugman, prêmio Nobel em economia e ativista
keynesiano por aumento de gastos públicos, cunhou a expressão “fada da
confiança” (no original “confidence fairy”, link aqui e aqui) para ironizar os
economistas que defendem austeridade como forma de estimular a economia.
Krugman argumenta que nas condições dos EUA (e também da Europa) não existem
bases teóricas para sustentar a tese que o corte nos gastos do governo levaria
a um aumento de confiança nos investidores que colocaria em funcionamento a
mágica da confiança. O debate por lá pegou fogo e muita gente boa entrou na
discussão de um lado ou de outro. Não vou discutir economia americana ou europeia
aqui, como de costume vou tratar da economia brasileira.
A fada da confiança que Krugman usou para ironizar os defensores
da austeridade por lá tem uma irmã que vive por aqui, para facilitar vou chamar
a versão original de fada azul e a irmã que vive por aqui de fada vermelha. A
mágica da fada azul consiste em fazer que ao testemunhar cortes nos gastos
públicos empresários passem a investir mais e consumidores passem a gastar mais
pois antecipam redução na taxa de juros e nos impostos. Assim como a água que
por aqui gira em direção contrária a que gira no hemisfério norte, a fada
vermelha faz uma mágica que funciona de forma contrária a da fada azul. A
mágica da fada vermelha faz que o aumento dos gastos do governo aumente a
confiança dos empresários e dos consumidores. Empresários sob feitiço da fada
vermelha investem mais por acreditarem que aumento do gasto representa garantia
de demanda futura, consumidores encantados pela fada vermelha gastam mais por
acreditarem que a aumento do gasto público garantirá empregos no
futuro. Apesar da fada azul e da fada vermelha usarem truques diferentes para
invocar a magia da confiança ambas garantem o mesmo resultado: a confiança
aumentará investimentos, consumo e nos abençoará com um ciclo virtuoso.
Guido Mantega, ex-ministro da Fazenda, era um devoto fiel da
fada vermelha. Apostou suas fichas que aumento dos gastos e discursos para lá
de otimistas fariam funcionar a mágica da fada vermelha. Joaquim Levy, atual
ministro da Fazenda, parece ser discípulo da fada azul, porém até agora acendeu
mais velas para o aumento de impostos do que para o corte de gastos. Talvez o
novo ministro seja discípulo de uma fada verde que ainda não foi bem descrita.
Seja lá a fada que siga Joaquim Levy, assim como Guido Mantega, parece
acreditar que negar a existência de problemas é uma boa forma de ajudar as
fadas da confiança (falei a respeito aqui).
O tempo ainda não permite saber a efetividade da magia da
fada de Levy. Porém podemos tentar ver se a fada vermelha teve sucesso em
trazer confiança a nossos empresários. A figura abaixo mostra o nível de
confiança de nossos industriais durante o governo Dilma.
Aqui entram em cena os anões. Nos mundos de fantasia anões
são descritos como gananciosos, trabalhadores e não raro possuem aversão a
mágica. Enquanto as fadas são descritas como seres delicados que costumam voar
entre as flores os anões possuem trações grosseiros e geralmente aparecem
enfiados em alguma montanha em busca de ouro ou pedras preciosas. Acredito que
em nossa condição atual precisamos mais de anões do que de fadas. Não me
entendam mal, o ajuste fiscal é necessário e será feito de um modo ou de outro,
apenas não acredito que resolvido o problema fiscal a mágica da confiança nos
fará retomar o crescimento. No mundo dos anões só consegue as coisas com
trabalho.
O que impede nossos anões de trabalhar? De saída digo que
nossa insistência em ver a ganância como algo a ser combatido é um banho de
água fria em nossos anões. Qual a razão de enfrentar os riscos das montanhas se
ficar com o ouro e as pedras preciosas é feio? Nossa cruzada contra a ganância
faz com que criemos cada vez mais dificuldades para os anões. Exigimos licenças
redundantes, criamos regras que retroagem contra os anões, taxamos em demasia o
ouro dos anões... é difícil escavar por aqui. As dificuldades não param,
existem alguns anões que são gananciosos mas preferem viver da amizade do Rei
do que dos riscos de enfrentar as montanhas, destinamos recursos valiosos para
estes anões. Tais anões aplicam estes recursos para que possam ficar ainda mais
amigos do Rei e para que dificultar o trabalho dos outros anões de forma a não
sofrer concorrência. Ao contrário dos anões normais os anões amigos do Rei
escondem sua ganância e falam que trabalham em nome da sociedade e dos pobres
do reino.
Não bastasse as dificuldades e a concorrência com os amigos
do Rei nossos anões ainda sofrem para encontrar anões bem treinados que possam
ajudar nas escavações. Os sábios da terra dizem que não é preciso treinar os
novos anões pois não existem escavações para empregar anões treinados, estes
mesmos sábios sentem dificuldade em entender a razão de anões sem treinamento
não conseguirem criar novas tecnologias ou mesmo dominar tecnologias
existentes. Tais sábios gostam de invocar feiticeiros que tornariam os anões amigos
do Rei em grandes campeões que levariam a glória do reino para outras terras, os
sábios garantem que os feiticeiros existem e já fizeram proezas em outras
terras, por aqui ainda não se viu a mágica dos feiticeiros funcionar, mas este
é assunto para outras conversas. Sem incentivos e sem anões treinados nossos
valentes escavadores se deparam com ameaça de falta de energia e água para
escavações e, quando conseguem retirar algo, faltam os trilhos para levar o ouro
ao mercado. Diz-se que alguns anões tentaram construir tais trilhos, mas o Rei os
ameaçou com o inferno eterno da burocracia infinita.
A verdade é que a situação desesperadora de nossos anões faz
com que muitos prefiram apostar nas fadas. É pena. Melhor seria se enquanto
Levy faz o ritual de invocação da fada azul o resto do governo buscasse uma
forma de atrapalhar menos a vida dos anões.
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