Todos aqueles que fizeram um curso de introdução a economia estudaram o multiplicador dos gastos públicos, também chamado de multiplicador keynesiano. Os que foram além do curso de introdução a economia e fizeram cursos de macroeconomia aprenderam que o conceito do multiplicador é objeto de intensos debates. Para os que ficaram curiosos sobre as críticas ao multiplicador keynesiano eu sugiro este texto de Robert Barro, professor de Harvard, no WSJ ou uma pesquisa sobre a Falácia da Janela Quebrada, para os que estão com preguiça de fazer a pesquisa recomendo este texto no site do IMB. Feitas as devidas ressalvas voltemos ao multiplicador.
A idéia é simples. Suponha que o governo resolva aumentar o gasto público por meio de compras de bens e serviços. Ao realizar esta compra o governo estará criando demanda. Para atender esta demanda os empresários vão aumentar a produção e, para isto, contratarão mais horas de trabalho. Mais trabalho significa mais salários, que por sua vez significa mais demanda, mais produção e mais contratações. No final o gasto do governo induziu um aumento na renda e na produção bem maior do que o gasto inicial. Se você leu os textos que recomendei acima já sabe os problemas desta lógica, mas peço que guarde estes problemas e siga acompanhando meu argumento. A valer a lógica do multiplicador o governo poderia induzir o crescimento da economia simplesmente gastando mais, não é de admirar que a maioria dos políticos sejam entusiastas das idéias de Keynes. Fazer o bem gastando mais do dinheiro do contribuinte é o sonho de qualquer governante.
Ocorre que esta lógica tem um limite, não falo das críticas dos textos acima, falo de um limite inerente a própria lógica. Para que o multiplicador keynesiano funcione é preciso que exista capacidade ociosa na economia, particularmente é preciso que existam fatores de produção que não estejam sendo utilizados. Em bom português: é preciso que exista desemprego. Vou além, quanto maior o desemprego mais a lógica do multiplicador funciona. É neste ponto que reside a razão do fracasso das políticas econômicas do governo Dilma. Quando o governo aumenta a demanda de uma economia com baixo desemprego o empresário não tem como contratar mais horas de trabalho, pelo menos não ao mesmo preço. O que acontece é que ou o empresário não aumenta a produção ou o empresário vai contratar trabalhadores que estão em outras empresas para aumentar a produção, porém neste último caso ocorrerá uma redução na produção da empresa que perdeu os trabalhadores. Nos dois casos a produção total não aumenta e a demanda criada pelo governo acaba virando aumento de preços pela velha e boa lei da oferta e da demanda. Foi exatamente o que aconteceu no governo Dilma.
A bem da verdade alguns poucos economistas keynesianos argumentam que ao criar demanda em uma economia próxima ao pleno emprego o governo induz os empresários a investir e aumentar a capacidade de produção por meio de novas máquinas e não de novos trabalhadores. Estes economistas formam um subconjunto dos economistas keynesianos heterodoxos e foram os que defenderam a política econômica de Dilma. Estes economistas devem a população uma explicação de porque o gigantesco aumento de demanda nos últimos não levou a um aumento da taxa de investimento no Brasil. Outro grupo de economistas enxerga na disputa por trabalhadores uma forma de aumentar os salários reais, neste grupo se encontram alguns economistas marxistas que não são muitos, mas existem. O problema é que aumentos de salários reais sem aumentos de produtividade costumam não se sustentar no longo prazo. Se o aumento do consumo tivesse levado a um aumento do investimento ainda se podia argumentar que este investimento poderia trazer os ganhos de produtividade necessários para sustentar o aumento dos salários reais. Ocorre que o exemplo recente do Brasil e de outros países da América Latina não sugerem que o aumento do consumo leve ao aumento do investimento.
Em resumo temos que na lógica liberal, incluindo de neoclássicos a austríacos, o multiplicador não existe ou é muito pequeno. Na lógica keynesiana dominante o princípio do multiplicador não se aplica a uma economia próxima ao pleno emprego. Mesmo entre os heterodoxos a idéia de aumentar investimento por meio do estímulo ao consumo é, para dizer o mínimo, controversa. Daí a pergunta que não cala: por que o governo Dilma arriscou a saúde econômica do Brasil em um experimento que não é justificado pela grande maioria dos economistas? Se pelo menos existisse um conjunto robusto de evidências empíricas para compensar a falta de suporte teórico... mas nem isto existe, muito pelo contrário.
quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014
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"Estes economistas devem a população uma explicação"
ResponderExcluirNão é bom dar nome aos bois quando se trabalha no meio acadêmico, né?!
Mas tudo bem, todos minimamente interessados sabem quem deve explicações...
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É complicado dar nomes porque filho feio não tem pai, muitos que apoiaram negam ou se fazem de desentendidos. Uma vez postei no FB alguns links, ainda tenho alguns guardados, quem sabe um dia me animo de fazer a lista com links para quem disse o que e quando disse.
ExcluirNa economia existe um elemento comportamental. Considere que a opção pelo aumento no gasto público pode estar relacionada as oportunidades de desvio de dinheiro público e não pela crença no multiplicador keymesiano. Nossos governos estão tomados a décadas por grupos cuja missão principal é o enriquecimento pessoal.
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