O FMI divulgou a nova versão de sua base de dados com projeções
até 2024 (link aqui). É uma boa oportunidade para dar uma olhada no que o FMI
projeta para o Brasil e outros países, vou começar pela dívida pública e em
outros posts falo de outras variáveis. Sei que alguns colegas de profissão
gostam de comparar a dívida pública do Brasil com a de países ricos como se
fizesse algum sentido comparar dívida de pobres, vá lá, emergentes, com dívida
de ricos. Já tratei da questão de comparar nossa dívida com a de países ricos
em outros posts (quem se interessar pode checar aqui, aqui e aqui), nesse post
vou me limitar a comparar a dívida pública como proporção do PIB no Brasil e outros
países da América Latina.
Para não ficar com gráficos de difícil leitura vou fazer as
comparações em grupos de três, Brasil e mais dois. Para começar vou pegar o
Chile, que é a referência de país ajustado do continente, e o México que é um
país grande, com mais cem milhões de habitantes e que guarda algumas semelhanças
importantes com o Brasil. A figura abaixo mostra a dívida pública como proporção
do PIB no Brasil, no Chile e no México. Repare que a dívida do Brasil é bem mais
alta como proporção do PIB do que as dívidas do México e do Chile, pelas projeções
do FMI chegaremos a 2024 com uma dívida de 97,6% do PIB contra 28,3% no Chile e
54,3% no México.
No segundo exercício a comparação foi com a Colômbia e o
Peru, mas uma vez estamos bem mais endividados que os outros países. A previsão
do FMI é que o Pero chega a 2024 com uma dívida de 25% do PIB e a Colômbia com uma
dívida de 40% do PIB, no Brasil, como já vimo a projeção é de 97,6% do PIB.
Para não ser acusado de trapacear na escolha dos países de
comparação resolvi facilitar e colocar Argentina e Equador no próximo grupo, assim
como o Brasil os dois países tiveram problemas com governos populistas de esquerda
e a Argentina é famosa por ter problemas periódicos com a dívida pública. De fato,
em 2018 a dívida pública da Argentina foi de 86,3% do PIB o que não é muito
longe dos 87,9% do Brasil no mesmo ano. Porém, ao contrário do que acontece com
o Brasil, as projeções do FMI apontam para uma trajetória de queda da dívida
como proporção do PIB por lá. Em 2024 o FMI projeta uma dívida de 59,5% do PIB
para Argentina, por aqui, como sabemos, a projeção é de 97,6%. No Equador a
dívida deve subir mais um pouco chegando a 49,2% do PIB em 2019, mas depois
caindo para 33,4% em 2024.
Eu poderia fazer mais grupos, mas não vale à pena, creio que
o leitor já entendeu a mensagem: nossa dívida pública é muito alta para nossos
padrões. Aos curiosos informo que as projeções do FMI são que a dívida como proporção
do PIB em 2024 será de 58,3% na Bolívia, 22,4% no Paraguai e 71,3% no Uruguai. A
bem da verdade devo dizer que o Brasil não foi o mais endividado dos países que
pesquisei, tem um que a dívida chega a 272,8% do PIB em 2024. Não é preciso bola
de cristal para adivinhar que estou falando da Venezuela. A figura abaixo
mostra a dívida como proporção do PIB no Brasil e na Venezuela, repare como a dívida
cresce rápido uma vez que começa o desastre. Até 2017 a Venezuela tinha uma
dívida de 33,1% do PIB, mas como é impossível manter a sujeira de baixo do
tapete indefinidamente em 2018 a dívida já era de 175% do PIN e em 2019 a previsão
é de 214,5%.
Por certo não estamos na direção de uma trajetória explosiva
como a da Venezuela, pelo menos não há indícios disso no momento, mas nossa situação
é delicada e exige medidas drásticas. O déficit primário tem que ser reduzido
nos próximos anos sob pena de perdermos o controle da dívida e agravar ainda
mais a crise desta década. A reforma da previdência é um passo fundamental, mas
tem que ser uma reforma que traga benefícios no curto prazo, nesse sentido
considero um erro usar o que for poupado com a reforma para financiar um regime
de capitalização. Precisamos de usar tudo que conseguirmos poupar na redução da
dívida, se Paulo Guedes quer usar um trilhão para financiar a mudança de regime
previdenciários então vamos ter de arrumar outro trilhão para segurar a dívida.
Por importante que seja a reforma da previdência, não dá para não ter um Plano
B em o caso da reforma demorar muito ou não sair (espero que não seja o caso). Esse
Plano B pode incluir um programa mais ousado de privatizações, incluindo venda
de ações da Petrobras; Caixa e BB, cobrança do dinheiro do Tesouro que está no
BNDES, BB e Caixa; cortes de gasto mais duros que os exigidos pela lei do teto;
adiamento por tempo indefinido da reestruturação da carreira dos militares, congelamento
de salários de servidores e outras medidas do tipo. Tudo isso pode parecer
muito duro para um país em crise, mas, acredite, é menos cruel que uma dívida fora
de controle.
Posso sugerir o tema de um post, professor? Mostre pra essa criançada que não viveu os anos 80, os efeitos na sociedade de uma crise econômica cuja raiz é o alto endividamento público.
ResponderExcluirJá pensou em usar um feed-rss? Seria bom.
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