Terminadas as eleições é hora de pensar o que fazer para
recolocar a economia brasileira nos eixos. Para isso a tarefa mais urgente é
recuperar a credibilidade da política econômica, tal recuperação será mais
difícil com Dilma do que seria com Aécio por um motivo simples: Dilma terá de
convencer ao mercado que não repetirá os muitos erros do primeiro mandato e
esse convencimento tem um custo. Como Aécio estava na oposição não teria o
custo do convencimento e poderia se concentrar no ajuste fiscal e na retomada
da credibilidade da política monetária. Enfim, isso é passado, Dilma foi eleita
e caberá a ela recolocar a economia nos trilhos... ou não.
A recuperação da estabilidade exige uma equipe econômica que
não hesite em tomar as medidas necessárias para recuperar a credibilidade do governo
junto ao mercado. Para isso não basta que a nova equipe econômica esteja
disposta a aumentar juros e cortar gastos, é preciso que o mercado acredite que
ela esteja disposta. Li que Luiz Carlos Trabuco Capri, presidente do Bradesco e
Eduardo Loyo são nomes considerados pelo governo (link aqui). Não conheço o
primeiro, mas por estar em uma posição de destaque no mercado a ida dele para o
governo sinalizaria que Dilma estaria disposta a dar autonomia à equipe
econômica, afinal é difícil imaginar que alguém largaria a presidência do
Bradesco para seguir ordens de Dilma ganhando muito menos do que ganhava. Creio
que a escolha de Trabuco para o Banco Central ou para a Fazenda acalmaria o
mercado e facilitaria a estabilização da economia. Eduardo Loyo eu conheço, é acadêmico
de primeira linha e atualmente está como economista-chefe do BTG Pacutal, tem
experiência no FMI e certamente teria a confiança do mercado e da academia. Não
sei como os militantes petistas que fizeram campanha contra Marina por ela ser
apoiada por uma herdeira do Itaú se sentirão se Dilma escolher Trabuco, para
oposição a piada de que o problema do PT não eram os bancos e sim o Itaú
(concorrente do Bradesco) já estará pronta. Os piadistas ainda podem se
beneficiar das cores de cada banco. Loyo deve ser mais palatável para a
militância, mas pode desagradar economistas heterodoxos que apoiaram a
reeleição de Dilma. Uma outra alternativa seria repetir a fórmula que deu certo
com Palocci e colocar no Ministério da Fazenda um político com carta branca
para formar uma equipe composta por técnicos de primeira linha. Um candidato
natural seria Jacques Wagner, atual governador da Bahia que está terminando o
segundo mandato, a escolha além de agradar ao PT faria justiça à votação que a
presidente obteve no Nordeste. Acredito que economistas ligados ao PT e/ou
governo Dilma como Mercadante e mesmo Nelson Barbosa teriam muito mais dificuldades
em aclamar o mercado do que os perfis que comentei acima. Mas se for para
seguir esse caminho creio que um economista que esteve afastado do país e
portanto fora dos embates dos últimos anos pode ser a melhor escolha, sim, eu
estou falando de Otaviano Canuto.
Feita a equipe econômica o próximo passo é controlar a
inflação e dar transparência às contas públicas. Seguindo uma Curva de Phillips
padrão dos bons manuais de macroeconomia a inflação depende das expectativas de
inflação e da diferença entre a taxa de desemprego e a taxa de desemprego
natural (não adianta, não vou discutir aqui se Curva de Phillips é válida,
basta saber que se não for meus argumentos ganham ainda mais força). Desta
forma quanto menor for a expectativa de inflação menor será o desemprego
necessário para trazer a inflação de volta ao centro da meta, infelizmente vale
o contrário. Uma boa escolha da equipe econômica facilitaria o combate à
inflação simplesmente por gerar menores expectativas de inflação. No fundo o
governo vai escolher entre agradar as bases e sacrificar a população para
segurar os preços, isso supondo que o governo vai combater a inflação. Um
ajuste fiscal seria desejável, mas não é algo fácil. Em primeiro lugar a nova
equipe econômica deve limpar a bagunça feita pela atual equipe e seus truques
contábeis e informar ao contribuinte sobre o real estado das contas públicas.
Após tudo esclarecido será possível abrir o debate sobre onde serão feitos cortes
e/ou sobre como arrecadar mais. Eu tenho minha sugestão de corte (dá mais que
bilhão e não é bolsa família, alguém falou bolsa empresário?) mas a decisão
deverá ser da sociedade por meio do Congresso Nacional quando da votação do
orçamento.
Após controlar a inflação e dar transparência às contas
públicas o governo pode se preocupar com crescimento. Em primeiro lugar será
necessário limpar os preços das montanhas de subsídios e privilégios setoriais dados
nos últimos anos, com tantos subsídios fica difícil saber para onde os preços
apontam e sem preços o governo não terá conhecimento para tomar decisões. Simultaneamente
deverá ser feita uma reversão de fato na estratégia de campeões nacionais do
BNDES de forma a permitir que empresários que não consigam ou não queiram ser
amigos do governo possam competir com os que são. Depois de fazer tudo isso
estaremos mais ou menos onde estávamos em 2005: uma economia estabilizada com
programas sociais de combate à pobreza bem estabelecidos e pronta para retomar o
crescimento.
A retomada do crescimento passa por uma redução brutal na
burocracia e no excesso de regulamentação, investimentos pesados em
infraestrutura e melhora na qualidade da educação. O primeiro pode começar
ontem. O emaranhado de regras torna quase impossíveis os investimentos públicos
e privados no país, concluir um projeto de grande porte então nem pensar. Um
sem números de fiscais das mais diversas agências está a postos para infernizar
os responsáveis por empreitadas públicas ou privadas. Claro que devem existir regras
que limitem o investimento, é legítimo que uma localidade não queira uma
fábrica poluidora na vizinhança, mas as leis que regulam estas e outras
limitações devem ser tão claras e simples quanto possíveis e as análises
técnicas devem ser tão rápidas quanto possível, de preferência devem ter prazos
determinados. É inadmissível que recursos públicos ou privados sejam desperdiçados
em empreendimentos que serão embargados anos após receberem autorizações
preliminares para começar. Gosto de resumir o caos burocrático em uma comparação
simples: Brasília foi construída em um mandato presidencial, o prédio da
faculdade que dirijo na Universidade de Brasília precisou de dez anos para
ficar pronto. Posso estender a comparação dizendo que nas chuvas da semana
passada na desabou no prédio principal da UnB, no prédio da faculdade que
dirijo parte grande do forro veio abaixo.
A simples redução da burocracia vai facilitar o investimento
levando a um aumento da capacidade de produção da economia e aumentando a
infraestrutura do país. Porém não será suficiente para resolver o nó da
infraestrutura em um país onde todo ano tem ameaça de racionamento de energia e
a maior cidade do país está próxima de um colapso no abastecimento de água.
Quem vai investir se não tem energia para tocar a fábrica? Será preciso
desenhar novas formas de parceria público-privadas que permitam a execução de
projetos de infraestrutura que a sociedade considerar importante mas que o
retorno seja muito baixo ou o risco muito alto ou ainda tenha grandes
dificuldades logísticas e/ou operacionais para atrair investidores privados.
Meus amigos libertários que me desculpem, a inciativa privada pode e dever fazer estradas, mas é preciso um governo para fazer
um Canal de Eire (link aqui) ou para transpor um São Francisco. Se a racionalização
e redução das regulamentações e burocracias forem estendidas às universidades
junto com a revisão e modernização do conceito de dedicação exclusiva visando
facilitar parcerias da academia com o restante da sociedade podemos ainda ter
um bônus no processo de inovação.
Finalmente a educação. Aumentos de gastos podem ser
necessários e/ou importantes, mas sozinhos não resolverão os problemas da
educação. O atual sistema é muito ruim e jogar dinheiro em algo muito ruim via
de regra não é uma boa estratégia, antes de colocar mais dinheiro na educação
devemos reformar todo o sistema, das creches às universidades. Agindo assim no
mínimo evitaríamos o que ocorreu quando o presidente da CAPES defendeu a
contração de professores por organizações sociais (OS) no regime de CLT (link aqui). Menos
do que a proposta, que pode e deve ser discutida, me espantou o fato da
proposta ter sido feita ao final de um grande ciclo de contratações de
professores por universidades federais. Não seria mais razoável discutir a
melhor forma de contratar professores antes de contratar um monte de
professores? Para não repetir erros como o do exemplo é fundamental que o governo
abra uma discussão a respeito do sistema de educação que desejamos, para a discussão
ter algum sentido é preciso que fique claro desde o começo que sindicatos de
professores (inclusive o meu) representam os professores e não os alunos ou a
sociedade. Enquanto nossos governantes e grande parte da sociedade confundirem
os interesses dos professores (inclusive os meus) com os dos alunos ou da
sociedade nossa educação estará condenada à mediocridade.
Quem quer que tenha conseguido ler até aqui deve estar
perguntando se a agenda rascunhada acima não seria mais apropriada a um governo
Aécio do que a um governo Dilma. Seria sim, eu reconheço, vou além, exatamente
por a agenda que proponho ser mais próxima (embora não idêntica) à do PSDB do
que à do PT é que votei em Aécio e não em Dilma. Porém não é meu interesse
reabrir os debates das eleições, quem preferir pode mudar o título para “Um
Esboço de Agenda Econômica para Oposição” ou “Um Esboço da Agenda Econômica do
Roberto Ellery”, eu juro que não vou ficar triste com quem fizer isso.
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