Se o Brasil vai mesmo entrar em uma trajetória mais forte de
crescimento, tenho minhas dúvidas, é de se esperar um aumento da taxa de
investimento. Nas contas nacionais referentes ao terceiro trimestre de 2019,
últimas disponíveis, é possível observar um aumento significativo dessa taxa
que, pela primeira vez desde 2015, ultrapassou os 17%. Ainda está longe do
nível pré-crise, quando andava acima de 20%, mas cresceu tanto em relação ao
trimestre anterior quando em relação ao mesmo trimestre de 2018.
O aumento da taxa de investimento e a necessidade de mais
aumento dessa taxa para que a economia volte a crescer, crescimento puxado por
produtividade ainda deve demorar, coloca questões importantes. Uma delas é como
fazer para evitar os investimentos ruins que nos levaram a atual crise, esse é
um tema fundamental que tratei em outros lugares e que não vou discutir nesse
post. A questão que quero colocar aqui é como será financiado esse aumento do investimento.
A taxa de poupança não mostra o mesmo crescimento da taxa de investimento e a
queda dos juros dificulta a atração de dólares do exterior, de fato, temos notícia
de grande saída de dólares em 2019 (link aqui).
A figura abaixo ilustra o problema, seguindo a estratégia do
IBGE na apresentação das contas trimestrais para deixar a figura menos confusa,
estão ilustrados apenas as taxas referentes ao terceiro trimestre de cada ano.
Repare o crescimento da taxa de investimento maior que o da taxa de poupança.
Salvo uma grande e inesperada reviravolta no comportamento da taxa poupança
essa diferença deve ficar ainda maior se a economia voltar mesmo a crescer. No
último trimestre de 2019 a diferença entre taxa de investimento (17,6%) e taxa
de poupança (13,5%) chegou a 4,1% do PIB.
Como essa diferença é financiada? Grosso modo, deixando de
lado detalhes técnicos de contabilidade nacional, dá para dizer que para bancar
essa diferença temos que pegar dinheiro com os estrangeiros. Por que “os gringos”
nos emprestariam esse dinheiro? Essa pergunta é mais difícil de responder. Nos
últimos anos as altas taxas de juros atraiam o capital necessário para financiar
nosso investimento, como vimos essa alternativa pode ser comprometida por conta
da queda de juros. A forte saída de dólares no ano passado reforça essa suspeita.
Considerando apenas dados de terceiro trimestre a diferença entre
taxa de investimento e taxa de poupança passou dos 4% apenas em 2001, ano do
racionamento e de problemas nas contas externas; 2010, ano que o governo usou e
abusou de estímulos para conseguir um crescimento de mais de 7%; e 2014, outro
ano em que o governo usou e abusou de estímulos para tentar adiar a crise que
já era inevitável. Que o terceiro trimestre de 2019 esteja em tão más companhias
é motivos para que chatos, como eu nunca neguei que sou, fiquem com a pulga atrás
da orelha.
A figura abaixo mostra a série completa da diferença entre a
taxa de investimento e a taxa de poupança. Quem tem mais idade ou acompanha a
economia brasileira talvez lembre que 2001 foi o ano que FHC decretou o “exportar
ou morrer” (link aqui), um período atribulado onde a restrição externa era ameaça
constante. Com a recuperação da economia e as reformas do primeiro mandato de
Lula o cenário reverteu e passamos a precisar de pouco financiamento externo,
em alguns trimestres tivemos mais poupança do que investimento. A partir de
meados da década passada começa a guinada na política econômica de Lula que é
reforçada com a crise de 2008, a necessidade de financiamento externo começa a
aumentar. Após o pico pré-crise, onde a diferença chegou a 5% do PIB, a forte queda
da taxa de investimento reduziu nossa necessidade de buscar financiamento
externo.
O aumento da necessidade financiamento externo ocorrido nos
últimos trimestres significa que estamos repetindo erros do passado? Não. É
perfeitamente possível depender de capital externo desde que o país seja atrativo
e que os recursos não sejam destinados a projetos ruins. Os esforços da equipe
econômica para tornar o país mais atrativo e reduzir as causas dos investimentos
ruins são dignos de registro, não são poucas as declarações do Paulo Guedes ou
do Adolfo Sachsida apontando nessa direção.
O problema é que, como dizia Mario Henrique Simonsen, coração
não é feito de tripas. Mesmo com a reforma da previdência, a MP da Liberdade
Econômica, a flexibilização de algumas leis trabalhistas, o teto de gastos e
outras medidas importantes tomadas desde o governo Temer, o Brasil continua
tendo uma dívida pública gigantesca para padrões de países emergentes e nosso
ambiente de negócios ainda é muito hostil aos empreendedores. Estariam os estrangeiros
dispostos a mandar dólares para cá com juros a 4,5% e o sobe e desce do real
junto com nossos problemas fiscais? Estariam os estrangeiros dispostos a investir
em projetos por aqui com nosso caos jurídico? Quanto mais pode subir nossa poupança?
Qual a diferença entre taxa de investimento e taxa de poupança que podemos suportar
e por quanto tempo? O quanto deve subir a taxa de investimento para a economia
crescer?
São perguntas importantes com respostas difíceis. A saída de
dólares sugere que os estrangeiros não estão muito dispostos a nos financiar
com essa combinação de taxa de juros e ambiente macroeconômico. O aumento do
investimento estrangeiro direito sugere que “os gringos” podem estar tomando
coragem de investir por aqui, mas é preciso ajustar por privatizações que podem
ter distorcido o número e saber o tamanho da coragem. As outras perguntas eu não
arrisco responder, no máximo registro que se a taxa de investimento tiver de
chegar a 20% vamos precisar de uma taxa de poupança de pelo menos 15% para não
voltarmos ao “exportar ou morrer” do começo do século. Não é impossível, mas também
não é fácil.
Bom post professor.
ResponderExcluirAcho que depois dessa ida a Davos e as recentes divulgações do Brasil no exterior, vamos ter novos aportes. A cesão onerosa do pré-sal não deu mt certo mas também o próprio petróleo está com o futuro ameaçado na análise de muitos analistas. Investir em infraestrutura no Brasil com certeza vai ser muito rentável para quem entrar agora.
Também acho muito melhor investir em empresas do que em bonds a juros zero lá fora. Nossa moeda vai se fortalecer.
Abraço!