Uma das explicações para atual crise que vivemos é que o
modelo econômico implantado pelo petismo focou apenas em consumo e esqueceu o
investimento. A explicação tem fundamento no fato que nossa taxa de
investimento é uma das mais baixas do mundo. Porém a análise dos dados brasileiros
não permite concluir que o período de bonança da primeira década do século XXI
não viu um aumento do investimento, pelo contrário, no primeiro trimestre de
2003, quando Lula tomou posse, a taxa de investimento era de 14,43% do PIB no
quarto trimestre de 2010, último trimestre dos governos Lula, a taxa de
investimento era de 18,55%. No terceiro trimestre de 2011, já no governo Dilma,
a taxa de investimento alcançou 19,20%, o maior valor desde 1991. A figura
abaixo mostra o comportamento da taxa de investimento (os dados foram obtidos
no Ipeadata).
O aumento da taxa investimento foi um padrão da primeira
década do século XXI, a única interrupção ocorreu quando da crise de 2008, mas
a recuperação veio de forma rápida. Foi este aumento da taxa de investimento
que fez com que diversos economistas apostassem que o governo Dilma seria
marcado por altas taxas de crescimento (lembram do governo do PIBão?). A
certeza era tão grande que muitos economistas se recusavam a ver que o
crescimento não vinha e começaram a elaborar explicações cada vez mais
complexas para a falta de crescimento. Como era possível o aumento na taxa de
investimento não levasse a um crescimento do PIB?
A pergunta não é tão fácil de responder. Tanto os modelos de
tradição neoclássica quanto os modelos de tradição keynesiana relacionam
aumento da taxa de investimento com aumento da taxa de crescimento da economia,
pelo menos no médio prazo. O que deu errado? Passei a atentar para esta questão
depois de um debate no IPEA onde eu argumentava que estávamos caminhando para
uma crise e o outro economista, um técnico do BNDES, defendia a tese contrária.
O debate foi em 2010 e os dados estavam quase todos contra minha tese, só os
dados de produtividade me davam razão, na época falar de produtividade soava esquisito,
coisa de neoclássico. O aumento da taxa de investimento foi o dado escolhido
para defender a tese que os próximos anos seriam de fartura. Na hora retruquei
falando de produtividade e argumentei que o aumento do investimento na década
de 1970 não impediu a grande crise da década de 1980.
Findo o debate tentei refletir como encaixar o aumento da
taxa de investimento na minha história que estávamos caminhando para uma crise.
A pista estava em um texto que escrevi juntamente com a Mirta Bugarin e o
Victor gomes e que foi publicado na Brazilian Review of Econometrics em 2005
(link aqui). Lá tratamos do investimento desperdiçado, ou seja, do esforço de
investimento que não vira capital. Existem muitos fatores que causam
desperdício de investimento, na época tínhamos em mente corrupção e obras
inacabadas. Porém o raciocínio pode se aplicar a projetos de baixíssimos
retornos como alguns estádios da Copa e as aventuras do Grupo X, aliás boa
parte dos investimentos da Petrobras no pré-sal podem acabar na conta de
desperdício de investimento.
O fato do esforço de investimento ocorrido entre 2003 e 2011
não ter sustentado o crescimento nos anos seguintes aponta fortemente na
direção da tese que houve desperdício de investimento no Brasil. Qual a razão
do desperdício? Não é fácil responder, mas as condições de investimento no
Brasil são muito propícias para a ocorrência do fenômeno. Temos um grande banco
financiador de investimento, o BNDES, que é sujeito a interferência política e
costuma agir como se o investimento fosse um fim em si mesmo. É juntar a fome
com a vontade de comer. O empresário amigo quer financiamento barato, os inquilinos
do planalto querem ajudar os empresários amigos, afinal campanhas e voos de
primeira classe são caros, e a tecnocracia acredita que aumentar a taxa de
investimento é o caminho para o crescimento. Preocupação com eficiência e
retorno? Bobagem, coisa de economista neoclássico que não conhece a realidade.
Naturalmente podem existir outras explicações para que o
aumento da taxa de investimento não tenha gerado crescimento, da mesma forma
podem existir outras explicações para o desperdício do investimento no Brasil. Porém
uma coisa é fato, não é possível dizer que o modelo petista estimulou consumo
às custas de investimento, houve aumento da taxa de investimento o que não veio
foi o crescimento. A lição me parece clara: não basta investir, é preciso
investir bem.
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