Por estar mais focado em questões de longo prazo a variável
que mais prende minha atenção é a produtividade. É bem verdade que, por dever
de ofício e gosto pelo debate, acompanho questões de curto prazo, nesse campo
costumo olhar mais para as políticas fiscal e monetária. Ocorre que o atual
debate a respeito da economia brasileira tem caminhado a passos largos para a
questão do emprego e da renda, desta forma resolvi olhar com mais cuidado a Pesquisa
Mensal de Emprego (PME) referente a julho de 2014 (link aqui). A PME é a principal
fonte de dados para o cálculo da taxa de desemprego no Brasil e também
apresenta dados com o rendimento médio do trabalho. Ao contrário da PNAD a PME
não tem abrangência nacional, a pesquisa tem abrangência restrita a seis áreas
metropolitanas. Na página do IBGE encontrei uma planilha com os dados para
Recife, Belo Horizonte, Rio de Janeiro e São Paulo, os dados para Salvador e
Porto Alegre não estão disponíveis por conta da greve no IBGE. No que segue
farei alguns comentários a respeito destes dados que podem jogar uma luz na
evolução do emprego e da renda no último ano.
A manutenção da baixa taxa de desemprego tem sido o
principal (único?) argumento dos que defendem a política econômica do governo
Dilma. O argumento não me convence pelo simples fato que antes de Dilma mudar a
política econômica o desemprego já estava baixo e a renda esteva crescendo.
Sendo assim o máximo que pode ser dito é que a mudança de política feita por
Dilma (ainda) não afetou o mercado de trabalho, muito pouco para quem abandonou
uma política que vinha funcionando desde 1999 com promessas de um aumento do
investimento, do crescimento e a recuperação da indústria. Antes que alguém
tire do bolso a incrível e triste história da crise econômica gostaria de
lembrar aos senhores que a crise foi em 2008 e que segundo a historiografia
oficial a crise foi superada em 2010 quando o Brasil cresceu mais de 7%, não
fui quem chamou a crise de marolinha. Deixemos de coisas e vamos aos dados.
Em relação a julho de 2013 ocorreu uma queda na taxa de
desocupação nas quatro áreas metropolitanas. A maior queda foi observada no Rio
de Janeiro, de 4,7% para 3,6%, enquanto a menor queda foi observada em Belo
Horizonte, de 4,3% para 4,1%. Em São Paulo a queda foi de 5,8% para 4,9% e em
Recife foi de 7,6% para 6,6%. Alguém pode argumentar que a queda na taxa de desocupação
ocorreu por conta da Copa, é possível, porém eu não apostaria nesta hipótese.
Outros indicadores mostram que os impactos da Copa na economia foram pequenos e
os números de julho estão parecidos com os de junho, o próprio IBGE afirma que
a taxa de desocupação ficou estável entre junho e julho.
Ocorre que existe um fator que ajuda a explicar a queda na
taxa de desocupação. Segundo a definição do IBGE a taxa de desocupação é
definida como a percentagem de pessoas desocupadas em relação a população
economicamente ativa. Desta forma a taxa de desocupação pode cair por conta de
mais gente ocupada ou por conta de menos gente em atividade. Os dados mostram
que entre julho de 2013 e julho de 2014 o número de pessoas economicamente
ativas caiu como proporção do número de pessoas em idade de trabalho. Os dados
estão na tabela abaixo. Dois padrões chamam atenção na tabela: (i) a população
ocupada (PO) caiu como proporção da população em idade ativa (PIA) em todas as
regiões metropolitanas pesquisadas, e (ii) a população economicamente ativa
(PEA) como proporção da PIA caiu em todas as regiões da amostra. A conclusão é
que a taxa de desocupação caiu por conta da redução de número de pessoas economicamente
ativas e não por conta de mais gente trabalhando, ou seja, o desemprego está
caindo porque as pessoas estão saindo do mercado de trabalho.
Região Metropolitana
|
PO, Jul 2013
|
PEA, Jul 2013
|
PO, Jul 2014
|
PEA Jul 2014
|
Recife
|
47,6%
|
51,6%
|
46,8%
|
50,1%
|
São Paulo
|
55,9%
|
59,3%
|
54,5%
|
57,2%
|
Belo Horizonte
|
55,8%
|
58,3%
|
53,9%
|
56,2%
|
Rio de Janeiro
|
52,0%
|
54,6%
|
51,5%
|
53,4%
|
P.O.: População Ocupada, PEA: População
Economicamente Ativa. Os valores estão como proporção da População em Idade
Ativa (PIA).
|
É possível fazer um exercício para calcular qual a seria a
taxa de desocupação em cada uma das regiões metropolitanas caso a PEA mão
tivesse caído em proporção da PIA, ou seja, qual seria o desemprego se as
pessoas não estivessem saindo do mercado de trabalho. A tabela abaixo mostra os
resultados do exercício. O resultado do exercício mostra que se não fosse pela
redução do número de pessoas no mercado de trabalho teríamos visto um aumento
da taxa de desocupação em todas as regiões metropolitanas pesquisadas. Em
Recife o desemprego estaria acima de 9%!
Região Metropolitana
|
Taxa de Desocupação, 2013
|
Taxa de Desocupação, 2014
|
Taxa de Desocupação alternativa
|
Recife
|
7.75%
|
6.59%
|
9.30%
|
São Paulo
|
5.73%
|
4.72%
|
8.09%
|
Belo Horizonte
|
4.29%
|
4.09%
|
7.55%
|
Rio de Janeiro
|
4.76%
|
3.56%
|
5.68%
|
Por conta de arredondamento existem
pequenas diferenças entre os números da tabela e os que estão na página do
IBGE.
|
Vimos que o desempenho do mercado de trabalho pode ser
explicado por pessoas saído do mercado, se isto é bom ou ruim requer mais
análises, se forem crianças e/ou jovens estudando por mais tempo pode ser um fenômeno
bom. Por outro lado se a redução da PEA como proporção da PIA decorrer de
pessoas que saem do mercado por perder a esperança em encontrar emprego então o
fenômeno pode ser preocupante. Em uma conversa a esse respeito no FB o Prof.
Flávio Ataliba Barreto, pesquisador que foi meu professor e que eu tenho enorme
respeito e consideração, a partir de uma “olhada” na PNAD sugeriu que a primeira
hipótese é mais condizente com os dados. Se for então é uma boa notícia, mas
talvez seja preciso se debruçar com mais cuidados sobre os dados para ter um
resultado mais confiável.
Passemos agora à renda. Na campanha o governo apresentou
como trunfo o aumento da renda do trabalho. O que dizem os números? A tabela
abaixo responde.
Região Metropolitana
|
Renda média, Jul 2013
|
Renda média, Jul 2014
|
Tipo que mais cresceu
|
Setor que mais cresceu
|
Recife
|
1.440,63
|
1.513,10
|
Emp. sem carteira setor privado
|
Construção
|
São Paulo
|
2.070,23
|
2.102,70
|
Emp. sem carteira setor privado
|
Comércio
|
Belo Horizonte
|
1.938,61
|
1.898,70
|
Emp. sem carteira setor privado
|
Serviços prestados às empresas
|
Rio de Janeiro
|
2.097,94
|
2.285,60
|
Emp. sem carteira setor privado
|
Construção
|
A boa notícia é que a renda do trabalho de fato cresceu em três
das quatro regiões, a má notícia é que apenas no Rio de Janeiro o crescimento
foi maior que a inflação acumulada nos últimos 12 meses. Outro dado que chama
atenção é que em todas as regiões o tipo de renda que mais cresceu foi a renda
dos empregados sem carteira do setor privado. Por um lado a notícia é boa
porque são pessoas que ganham menos, por outro lado fica difícil imaginar que
este setor é o alvo de políticas do governo visando o emprego e a renda.
Os números do IBGE mostram que de fato o emprego e a renda
ficaram estáveis nos últimos doze meses, o primeiro tece uma leve melhora e a
segunda, se descontada a inflação, caiu um pouco. Por outro lado os números mostram
que nos últimos doze meses não foi a criação de empregos que manteve a taxa de desocupação
em baixa, os números também mostram que o melhor desempenho do mercado de
trabalho ocorreu entre os empregados sem carteira assinada do setor privado,
não foi nos setores beneficiados por desonerações e empréstimos camaradas. Não
são números para se lamentar, mas também não batem com a história que o governo
quer contar de que o desempenho do mercado de trabalho decorre de desoneração
de impostos, crédito amigo do BNDES e outras bondades que Dilma fez para os
empresários amigos.
0 comentários:
Postar um comentário