segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Carta Brasil - Um conjunto de propostas para o novo governo

Hoje foi divulgado um documento assinado por vários economistas com propostas para o Brasil, o documento, chamado Carta Brasil, será entregue a Paulo Guedes, futuro ministro da Economia, recebeu ampla divulgação na imprensa, em uma pesquisa rápida encontrei referências a Carta Brasil em veículos como Valor Econômico (link aqui), Estadão (link aqui), Revista Exame (link aqui) e Infomoney (link aqui). Longe de representar um consenso, que seria impossível, a Carta Brasil aponta direções que refletem uma opinião média dos participantes do grupo. Eu poderia listar facilmente algumas propostas das quais discordo, mas deixo isso para outra ocasião, no momento compartilho com os leitores a apresentação escrita pelo amigo Flávio Ataliba Barreto, o herói que é o principal responsável pela existência do grupo de carta, e um link para o texto completo da Carta Brasil (link aqui).

Apresentação
Flávio Ataliba Barreto

Imaginem mais de duzentos economistas a conversar e a debater em seus celulares todos os dias sobre os mais diversos problemas econômicos do país e do mundo. Isso só é possível graças à revolução digital e seus aplicativos que, nos últimos anos, vêm possibilitando a conexão, em tempo real, de um grande número de pessoas. Aproveitando o surgimento dessa nova tecnologia digital, em 13 de agosto de 2015 foi criado no Ceará, inspirado no dia do economista, um grupo de economistas usando a plataforma do whatsapp, que rapidamente teve várias adesões, até chegar ao formato atual, nomeado Economistas do Brasil.

O início dos debates do grupo coincide, entretanto, com o aprofundamento da crise econômica no Brasil, iniciada já em 2014 e que se agrava com o impeachment da Presidente Dilma em 2016, tendo consequência até os dias atuais. É nesse ambiente de incertezas econômicas e instabilidade política que os Economistas do Brasil intensificaram as discussões, procurando levantar e compartilhar diagnósticos dos problemas, assim como apontar possíveis soluções. Evidentemente, mesmo que o grupo seja formado majoritariamente por economistas com forte formação em teoria econômica e ótimo domínio das ferramentas de análises quantitativas, muitas vezes, durante os debates internos, observou-se entendimentos um pouco diferentes sobre certas questões, isso fruto da própria complexidade dos fenômenos econômicos e sociais envolvidos nas discussões.

Por outro lado, a riqueza dos debates realizados gerou também grandes convergências na compreensão das principais causas dos diversos problemas e possíveis soluções, como a necessidade de se dar sustentabilidade às contas públicas. Isso de alguma forma contagiou a todos no sentido que se mostrou viável redigir um documento condensando as ideias debatidas. O primeiro passo foi a realização de um seminário de dois dias que ocorreu no final de janeiro de 2018, no Rio de Janeiro, em que mais de 70 economistas reunidos, discutiram de forma mais detalhada vários temas como a questão tributária, mercado de trabalho, previdência, comércio exterior, entre outros, que estão apresentados nessa carta, intitulada Carta Brasil.

A partir desse seminário, foi iniciada a elaboração desse documento em que se procurou condensar o pensamento médio do grupo nos diversos temas. Conscientes de que o debate sobre a sucessão presidencial nas eleições de 2018 iria colocar em discussão várias dessas questões o objetivo inicial foi ainda mais fortalecido no sentido de querer apresentar ao próximo Presidente eleito um conjunto de ideias concatenadas que possam ajudar o Brasil a superar os tempos difíceis presentes e futuros.

A Carta Brasil constitui-se assim do esforço de cada um, seja de forma direta escrevendo os textos, ou indiretamente através de opiniões e comentários durante os debates no grupo. Este documento não tem a pretensão de querer representar de forma fidedigna a opinião de cada um, o que é mesmo impossível, mas colocar em grande relevo as diretrizes gerais de um pensamento o mais próximo da ideia comum daqueles que o subscrevem. De fato, o mais importante de todo esse processo, materializado agora nessa Carta, é o desejo de colaborar e oferecer de forma honesta e desapaixonada ideias que possam efetivamente contribuir para o progresso do país e a melhoria de vida do povo brasileiro.


sexta-feira, 9 de novembro de 2018

Sem milagres nem marchas forçadas, é devagar que vamos mais longe.


Fiz um post no FB onde comentei uma entrevista de Winston Ling (link aqui) e registrei que apesar de concordar com as linhas gerais apresentadas na entrevista me incomodei com a referência a China pois não acredito que a maioria dos brasileiros queiram viver em uma nova China e que eu definitivamente não quero que o Brasil vire uma espécie de China. Vários amigos me alertaram que a referência a China era no sentido do crescimento econômico em contraponto a hipóteses que fosse em termos de instituições. Fiquei meio sem graça de dizer aos amigos que eu me referia ao crescimento econômico, isso mesmo, eu não quero que o Brasil busque uma trajetória de crescimento chinesa. Por certo não digo isso por conta do crescimento propriamente dito, mas por conta do que seria necessário para obter tal trajetória.

O crescimento da China vem de uma combinação de abertura para o setor privado, altas taxas de poupança e forte presença do estado nas decisões de investimento. A aparente contradição entre abertura para o setor privado e a forte presença do estado na economia é desfeita quando consideramos o ponto de partida da China. Depois de uma das mais brutais e desastrosas tentativas de implementar uma economia planificada o Partido Comunista Chinês percebeu que aquilo não levaria a lugar algum e começou um processo de abertura para investimentos privados, porém esse processo não retirou do estado o papel de condutor do processo de crescimento econômico. Nesse sentido a China de hoje vive uma experiencia similar a do Brasil do começo da década de 1970 onde o estado “comandava” uma dinâmica de crescimento que passou para história como Milagre Econômico. O que veio depois do Milagre não foi o paraíso das riquezas, pelo contrário, passamos a viver em um inferno econômico com direito a décadas perdidas, hiperinflação, calote de dívida pública e etc.

Não estou dizendo que esse será o destino da China, existem diferenças importantes que podem permitir que a China siga o rumo do Japão e da Coreia em vez de seguir o rumo do Brasil e da América Latina. Tais diferenças passam pela taxa de poupança absurdamente alta e um sistema de educação que parece ser bem superior ao brasileiro, pelo menos considerando os dados do PISA. Se isso vai ser suficiente é assunto para outro post, da minha parte creio que sem uma profunda mudança nas instituições de forma a garantir liberdades individuais a China não vai muito além de onde está em termos de PIB per capita, mas entendo quem discorda da minha avaliação. A questão desse post não é sobre a China, a questão é saber se um novo milagre econômico levará o Brasil ao paraíso ou nos manterá no inferno em que estamos.

Minha avaliação é que um novo milagre nos levará a um novo desastre. Para começo de conversa não vejo como ter poupança asiática sem desmontar a rede de proteção social aprofundada desde a redemocratização, mas existente desde muito antes. Basta ver a dificuldade para aprovar a reforma da previdência para que tenhamos noção de onde vai dar uma tentativa de acabar ou reduzir significativamente iniciativas como o SUS, o bolsa família, a rede de universidades públicas, as férias remuneradas, o seguro desemprego e tantas outras políticas públicas que tornam quase impossíveis níveis de poupança pública e privada com padrões asiáticos. Qual o nível de repressão necessário para reduzir drasticamente os ditos direitos sociais e trabalhistas? Qual o nível de repressão necessário para desmontar a rede de proteção social? Não sei e não quero pagar para saber.

Creio que se o Brasil quiser entrar em uma trajetória de crescimento deve esquecer os milagres asiáticos e buscar inspiração nos casos de sucesso dos Estados Unidos e Europa ou mesmo Austrália. Digo isso desde muito tempo, a referência mais antiga que encontrei em tempos de “print ou não aconteceu” foi uma matéria da Exame de 2010 (link aqui) onde digo que o Brasil não deve buscar crescimento chinês e que insistir nesse caminho acabaria levando a uma crise. Muita coisa mudou de lá ´para cá, mas não mudei minha avaliação, pelo contrário, a busca pelo PIBão nos levou a uma gigantesca crise e reforçou minha impressão que naõ devemos buscar milagres.

Para ilustrar a experiência de crescimento dos países hoje ricos usei a base de dados do projeto Maddison (link aqui) que apresenta dados de crescimento para vários países por um longo período de tempo. Selecionei nessa base todos os países com PIB per capita cima de $30.000 em 2016, depois escolhi os que tinham dados completos desde 1801, fiquei com Reino Unido, Itália, Suécia e Estados Unidos, por conta de anomalias no período da II Guerra retirei a Itália da amostra.

A figura abaixo mostra a taxa de crescimento dos EUA entre 1801 e 2016. Note que são poucos os anos em que os EUA cresceram mais de 10%, para ser preciso isso aconteceu em 1909, 1916, 1923, 1935, 1941 e 1942. Em 1909 a economia se recuperava de uma queda de 9,9% ocorrida em 1908, em 1935 era a recuperação da sequência de quedas iniciadas em 1930 com a Grande Depressão, 1941 e 1942 foram anos de guerra. Se baixarmos o sarrafo para um crescimento de 7,5% a lista passa a incluir os anos de: 1879, 1880, 1892, 1895, 1901, 1906, 1918, 1934, 1936, 1937, 1940, 1943 e 1950, repare que apenas nos períodos 1879-80 e 1936-37 os EUA cresceram mais de 7,5% por dois anos seguidos, note também a presença marcante de anos de guerra e da recuperação da Grande Depressão na lista. Baixando ainda mais o sarrafo para 5% entram na lista os anos de 1830, 1831, 1844, 1853, 1863, 1899, 1905, 1926, 1929, 1939, 1944, 1951, 1959, 1965, 1966 3 1984, mais uma vez não observamos sequencias de crescimento capazes de configurar um milagre. Considerados os 216 anos entre 1801 e 2016 os EUE cresceram mais que 5% em apenas 38 anos e em apenas dois casos o crescimento acima de 5% ocorreu em três ou mais anos seguidos: na recuperação da Grande Depressão entre 1934 e 1937 e no período da II Grande Guerra entre 1939-1944. De fato, não há uma só década em que os EUA tenham crescido mais de 5% ao em média, nem na década de 1950.



No Reino Unido a história não é muito diferente, assim como nos EUA não há uma década entre 1801 e 2016 com crescimento médio acima de 5% ao ano. No período o Reino Unido nunca cresceu mais que 10% ao ano, apenas em 1815, 1863, 1922, 1927, 1940 e 1941 o crescimento ficou entre 7,5% e 10%, entre 5% e 7,5% nos anos de 1807, 1810, 1827, 1835, 1844, 1856, 1894, 1915, 1934 e 1973. Dos 216 anos da amostra apenas em 17 a taxa de crescimento ficou acima de 5% ao ano. A figura abaixo mostra os dados.




Na Suécia, assim como nos EUA e no Reino Unido, não há registro de uma década com crescimento médio acima de 5% ao ano. O único ano com crescimento acima de 10% foi 1870, nos anos de 1810, 1883, 1906, 1946 e 1947 o crescimento ficou entre 7,5% e 10%, entre 5% e 7,5% em 1805, 1811, 1855, 1876, 1879, 1891, 1903, 1907, 1913, 1916, 1920, 1922, 1924, 1929, 1934, 1939, 1961, 1964, 1970 e 2010. Dos 2016 anos analisados em apenas 28 o crescimento ficou acima de 5% ao ano, não há casos de três anos seguidos com mais de 5% de crescimento. A figura abaixo mostra os dados da Suécia.




O número de países disponíveis para análise aumenta de forma considerável se em vez de escolher 1801 como ponto de partida a escolha for 1901. Para não deixar o post ainda mais cansativo vou me limitar a dois países nesse novo intervalo de tempo: Suíça e Austrália. No primeiro o crescimento ficou acima de 10% em 1922, 1937 e 1946, entre 7,5% e 10% em 1924 e entre 5% e 7,5% em 1904, 1916, 1920, 1927, 1951, 1955, 1956, 1959, 1961 e 1970. Considerando os 116 anos decorridos entre 1901 e 2016 a Suíça cresceu mais de 5% em 14 desses anos. Não há registro de três ou mais anos seguidos com crescimento acima de 5%, o único caso de dois anos seguidos com esse crescimento foi 1955 e 1956, não há caso de década com crescimento médio de mais de 5% ao ano. A figura abaixo mostra a taxa de crescimento na Suíça.




Dos 116 anos analisados a Austrália cresceu acima de 10% apenas em 1941 e 1942, não há caso de crescimento entre 7,5% e 10% e crescimento entre 5% e 7,5% aconteceu em 1903, 1904, 1906, 1909, 1935, 1940 e 1984. No total o crescimento foi maior que 5% em 10 dos 116 anos considerados, não há caso de década com crescimento médio de mais de 5% ao ano. A figura abaixo ilustra os dados.




O contraste com a Ásia é claro, considerando os dados do projeto Maddison a China cresceu em média 5,9% ao ano na década de 1990 e a uma média de 8,6% ao ano na década passada. A Coreia cresceu em média 5,9% ao ano na década de 1960, 6,7% ao ano na década de 1970, 7,8% ao ano na década de 1980 e 6,1% ao ano na década de 1990, foram quatro décadas seguidas crescendo a uma média superior a 5% ao ano. O Japão cresceu a uma média de 7,6% ao ano na década de 1950 e 9,3% ao ano na década de 1960. Singapura cresceu a uma média anual de 6,9%, 7,4% e 5,3% nas décadas de 1960, 1970 e 1980 respectivamente. Se recordarmos que Estados Unidos, Suécia e Reino Unido não tiveram uma década sequer de crescimento médio acima de 5% ao ano entre 1801 e 2016 e que Austrália e Suíça também não tiveram esse crescimento em nenhuma das décadas entre 1901 e 2016 fica claro o contraste entre a experiência de crescimento desses países e a experiência de crescimento dos países asiáticos no pós-guerra.

Talvez o caminho do Brasil, ou mesmo da América Latina como um todo, não seja nem o dos países ricos do ocidente nem o dos milagres asiáticos, é muito provável que “nuestra” América tenha de encontrar o próprio caminho para riqueza. O ponto que tento fazer nesse post é que comparando o quadro geral e as experiências anteriores de países como Brasil, Argentina, Colômbia e México é muito mais provável que nosso caminho para riqueza envolva uma marcha lenta e constante como a dos primeiros países analisados do que uma marcha forçada como as da Ásia. Já tivemos nossa marcha forçada e não gostamos dela, no que depender de mim andaremos devagar porque já tivemos pressa e já choramos demais.


quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Votos por partido para o aumento do salários dos ministros do STF

Hoje o Senado aprovou o aumento dos salários dos ministros do STF de R$ 33,7 mil para R$ 39,2 mil. O impacto da medida é significativo pois esse aumento de salários pode levar a aumento de salários em outras carreiras inclusive nos estados. Estimativas preliminares sugerem que o impacto fiscal deve ser de, no mínimo, R$ 4 bilhões por ano (link aqui e aqui), algumas estimativas sugerem que pode chegar a R$ 6 bilhões por ano. O UOL listou como votou cada senador (linik aqui), foram 41 votos favoráveis, 16 votos contrários e uma abstenção do senador José Maranhão do MDB da Paraíba. A figura baixo resume os votos favoráveis por cada partido.



O PSDB foi o partido que mais contribuiu com votos para aprovação do aumento, em segundo lugar veio o MDB e depois Podemos, PR e PSD aparecem empatados. Os partidos que mais deram votos contrários foram o DEM e o PT seguidos por MDB e PSB, a figura abaixo mostra os votos contrários dados por cada partido.



Confesso que esperava dos tucanos, o momento é de ajuste fiscal e esse tipo de medida além de elevar o gasto público e passar um péssimo sinal para a população que em breve vai ser chamada para pagar parte da conta do ajuste fiscal. Registro que estou ciente da promessa de cortar auxílios moradia para juízes e promotores como forma de compensar parte do aumento de gastos, é difícil não ver essa barganha como uma espécie de chantagem com o pagador de impostos, afinal se o auxílio é ilegal não deveria existir e se é legal apenas uma mudança na legislação deveria poder acabar com o referido auxílio. De toda forma, mesmo que a promessa seja cumprida fica o péssimo exemplo dado pelo Senado hoje.

sexta-feira, 2 de novembro de 2018

Doing Business 2019: melhorou, mas nosso ambiente de negócios continua ruim


Nesta semana tivemos a boa notícia que o Brasil melhorou de posição no ranking de facilidade de fazer negócios elaborado pelo Banco Mundial (link aqui), conhecido como Doing Business (link aqui). Quem acompanha o blog sabe que considero o ambiente hostil aos negócios um dos maiores problemas de nossa economia, isso é verdade porque um ambiente desfavorável aos negócios penaliza empresas menores e/ou que tentam entrar no mercado. Na prática o ambiente de negócios acaba funcionando como uma barreira a entrada que protege empresas estabelecidas que já pagaram os custos fixos associados ao ambiente de negócios ruim da concorrência das empresas que seriam viabilizadas em um bom ambiente de negócios. Melhorar o ambiente de negócios significa facilitar a entrada de novas empresas no mercado o que aumenta a competição e estimula a produtividade.

Apesar da melhora ainda há muito ser feito para melhorar o ambiente de negócios no Brasil, nesse post comparo nossa classificação geral e nos vários indicadores que compõem a nota geral com a pontuação dos países do grupo de renda média alta, nosso grupo de comparação segundo o Banco Mundial. A figura abaixo resume a análise que segue e mostra as notas do Brasil no índice de facilidade de fazer negócios e nos diversos indicadores usados para construção do índice, em vermelho estão os indicadores onde a nota do Brasil ficou abaixo da nota média dos países de renda média alta, em azul os indicadores em que nossa nota ficou acima da média.



Na classificação geral ficamos na 109º posição com um total de 60,01 pontos. Nossa pontuação ficou um pouco abaixo da média (63,57) e da mediana (63,59) do grupo, não é de todo ruim, mas também não é bom. A figura abaixo mostra a pontuação (nas barras) e a classificação (número ao lado da barra) e cada país do grupo de renda média alta, estamos logo abaixo da Namíbia e acima do Paraguai.



Por interessante que seja o índice geral não permite observar as razões que determinam o desempenho de cada país, para resolver esse problema é necessário analisar os indicadores específicos de cada grande grupo: começar um negócio, permissões para construções, acesso à eletricidade, registro de propriedade, acesso ao crédito, proteção a investidores minoritários, pagamento de tributos, comércio internacional, impor contatos e solução de falências. Cada um desses indicadores pode ser decomposto em indicadores ainda mais específicos, não analisarei essa decomposição mais fina nesse post para não forçar a paciência do leitor com muitos detalhes.

O primeiro indicador a ser analisado diz respeito a facilidade de começar um negócio. Quando mais fácil for começar um negócio mais ideias se transformam em empresas que podem introduzir novas tecnologias no mercado e trazer competição para empresas estabelecidas. Nesse indicador nossa pontuação foi de 80,23, ficamos entre África do Sul e Costa Rica, a média do grupo foi de 82,36 e a mediana foi de 85,38, ou seja, estamos abaixo da média e é mais difícil começar uma empresa por aqui do que em mais da metade dos países de renda média alta. A figura abaixo mostra a pontuação e a classificação no ranking geral de todos os países do grupo.




O próximo indicador mede a burocracia necessária para construir, nesse quesito ficamos em último lugar entre os países avaliados. Nossa pontuação foi de 49,86 contra uma média de 68,67 no grupo. É mais difícil conseguir permissão para construir no Brasil do que na Venezuela, na prática essa dificuldade age como barreira à entrada a medida que dificulta a construção de novas plantas. A figura abaixo mostra esse indicador para os países do grupo. É importante registrar que melhorar esse indicador envolve mudanças na burocracia, o que pode impor um significativo custo político por ir contra grupos de interesse estabelecidos, mas não exige grandes custos financeiros. Um esforço para facilitar as construções também pode estimular a construção civil sem ter de apelar para incentivos de crédito ou fiscais.



No indicador de acesso a eletricidade tivemos um bom desempenho, nossa nota foi 84,37 contra uma média de 72,22 e uma mediana de 71,22, de fato ficamos em nono lugar nesse quesito entre todos os países do grupo, dentre os países da América Latina e Caribe ficamos atrás apenas da Costa Rica. A figura abaixo mostra esse indicador.



O quarto indicador mede a facilidade de registrar propriedades, a nota do Brasil foi 51,94 contra um média de 63,71 e uma mediana de 65,43. Ficamos logo abaixo de Belize e logo acima da Venezuela, não estou enganado, olhei de novo para ter certeza, registrar uma propriedade no Brasil é quase tão difícil quanto na terra do Maduro. Mais uma vez temos um desempenho ruim em um quesito que envolve burocracia, afigura abaixo mostra o desempenho dos países de renda média em relação a facilidade de registrar propriedades.



A nota do Brasil no quesito acesso ao crédito foi 50, a média do grupo nesse indicador foi 56,12 e a mediana 60,00, mais uma vez ficamos na parte de baixo. Antes que alguém se anime e comece a pedir queda nos juros informo que esse quesito está ligado a questões institucionais como proteção a direitos e registros de crédito e não a indicadores de volume de crédito e coisas do tipo, mais uma vez é burocracia que dificulta a vida dos empreendedores no Brasil.



Na proteção a investidores minoritários o Brasil teve um bom desempenho, ficou com nota 65,00 contra uma média de 54,51 e uma mediana de 55,00. Dentre os países de renda média alta da América Latina e Caribe apenas a Colômbia teve um desempenho melhor que o do Brasil. A proteção a investidores minoritários é importante para atrair financiadores dispostos a apostar em negócios promissores. A figura abaixo mostra esse indicador.



Facilidade em pagar tributos é um quesito que o Brasil costuma se destacar negativamente com o subitem tempo para pagar impostos, não se trata do tempo para conseguir o dinheiro e sim do tempo para preencher a papelada. No Brasil uma empresa precisava dedicar cerca de 2.600 horas para conseguir pagar tributos, o segundo pior desempenho nesse quesito era da Bolívia com 1.025 horas, menos da metade do Brasil. Este ano o tempo gasto com papelada para pagar tributos no Brasil caiu para 1;958 horas, um valor ainda absurdamente alto. Considerando o indicador como um todo o desempenho do Brasil também é muito ruim, nossa nota foi 34,40 contra uma média 68,09 e uma mediana de 76,14 dos países de renda média alta. De fato, apenas a Venezuela, com 15,35, teve um desempenho pior que o Brasil nesse indicador. Não há razão aceitável para justificar a dificuldade para pagar impostos no Brasil, não bastasse a carga tributária ser alta para um país emergente ainda criamos dificuldades necessárias para que empresas fiquem em dia com fisco. A figura abaixo mostra esse indicador.



Muito se fala nas barreiras tarifarias que tornam o Brasil uma economia excessivamente fechada, aqui mesmo no blog já tratei do assunto (link aqui) em um post onde mostrei que nossas tarifas são mais altas que a do grupo de países de renda média alta e comparáveis a de países pobres. Para além da tarifa a dificuldade de fazer comércio também pode explicar o isolamento econômico brasileiro. Nossa nota no quesito comércio internacional foi 69,85 contra uma média de 71,93 e uma mediana de 74,26 no grupo de países de renda média alta. Não é o horror do tempo de pagar tributos e do registro de propriedades, mas é um desempenho que nos coloca na parte de baixo da distribuição. A figura abaixo ilustra esse indicador.



Para fazer valer contratos estamos na parte de cima da distribuição, nossa nota foi 66,00 contra uma média de 58,37 e uma mediana de 58,59 no grupo de países. Considerando os países da América Latina e Caribe que estão no grupo de comparação apenas o México tem um desempenho melhor que o nosso. A figura abaixo ilustra esse indicador.



O último indicador trata da solução de falências, por certo ninguém abre um negócio pensando em ir à falência, mas essa é uma realidade que não pode ser esquecida. Facilitar processos de falência é importante para incentivar a criação de novas empresas e para permitir a realocação de fatores alocados em empresas que deram errado. Nossa nota nesse item foi 48,48 o que nos deixa um pouco acima da média dos países do grupo que foram avaliados nesse quesito, 47,44, e acima da mediana, 45,93. A figura abaixo ilustra o indicador.



Em resumo o Brasil obteve nota inferior a média do grupo de países de renda média alta no indicador geral de facilidade de fazer negócios e nos indicadores que medem a facilidade para começar um negócio, fazer comércio internacional, registrar propriedades, acessar crédito, obter permissão para construir e pagar tributos. Ficamos acima da média nos quesitos: acesso a eletricidade, fazer valer contratos, proteção a investidores minoritários e solução de falências. Não é um bom desempenho, temos muito a melhorar se quisermos um ambiente de negócios saudável e capaz de permitir o nascimento e crescimento de novas empresas que trarão inovações e, por meio da competição, vão induzir as empresas estabelecidas a adotar tecnologias mais modernas e usar de maneira mais eficiente as tecnologias existentes. Um dos grandes desafios para melhorar nosso ambiente de negócios e enfrentar grupos de interesse formados pela burocracia estatal e por empresas estabelecidas no mercado.