Estava analisando a nova versão da Penn World Table (link
aqui) e resolvi fazer uma comparação rápida entre os países que mais cresceram
e os países que menos cresceram entre 1990 e 2014. Para comparação considerei
apenas os países que tinham mais de cinco milhões de habitantes em 1990. Dentre
as diversas variáveis disponíveis escolhi as que não apresentam, ou não
deveriam apresentar, tendência para não ter problemas em usar médias em um
período de mais de vinte anos. Infelizmente a PWT não tem anos médios de
estudo, uma variável que eu gostaria de ter usado, a medida de capital humano
da PWT considera anos de estudo e rendimento do capital humano, o que é padrão
na literatura, mas como o efeito combinado destas duas variáveis exigiria
cuidados que não caberiam nesse post optei por deixar de fora o capital humano.
Também deixei de fora a taxa de crescimento da produtividade total dos fatores,
para incluir esta variável eu teria de abrir mão de muitos países.
No final fiquei com cinquenta e oito países e considerei as seguintes variáveis: horas médias trabalhadas, taxa de investimento, tamanho do governo
definido como a proporção do consumo do governo no PIB e grau de abertura. Repare
que não considerei o PIB per capita em 1990, alguns modelos sugerem que o PIB
per capita do ano inicial é a variável mais importante para explicar a taxa de
crescimento nos anos seguintes, outros dizem que o PIB per capita inicial não é
tão importante, nenhum recomendaria deixar de fora o PIB per capita inicial para
modelar taxa de crescimento. Como o objetivo do post é matar uma curiosidade minha
e nem de longe é propor um modelo para explicar taxa de crescimento resolvi
deixar de fora o PIB per capita inicial, assim espero que ninguém comente o
post come se houvesse algum objetivo de propor um modelo capaz de explicar crescimento.
Para definir os grupos separei os países em quatro grupos do
país de menor crescimento para o país de maior crescimento. Considerei como
crescimento baixo os países do primeiro grupo e como crescimento alto os países
do último (quarto) grupo. A tabela abaixo mostra a média de cada variável por grupo de
países.
Grupos
|
||
Variável
|
Baixo
|
Alto
|
Horas médias trabalhadas por ano
|
1.885
|
2.024
|
Taxa de Investimento
|
16,77%
|
18,99%
|
Gasto do Governo/PIB
|
21,41%
|
18,21%
|
Grau de Abertura
|
17,75%
|
19,93%
|
Considerando a tabela acima podemos concluir que nos países
que mais cresceram entre 1990 e 2014 as pessoas trabalharam mais, as empresas
investiram mais, o governo consumiu menos em relação ao PIB e a economia foi
mais aberta do que nos países que cresceram menos. Isso quer dizer que se um
país trabalhar mais, investir mais, reduzir o tamanho do governo e se expor
mais ao comércio esse país vai crescer mais? Não, ou seja, sim, mas não por conta
da tabela acima. Existe uma literatura significativa a respeito de crescimento econômico
que justifica que a resposta seja sim, como costuma ser o caso a resposta não é
unânime, mas creio ser justo dizer que a maior parte da literatura suporta o
que estou dizendo.
Para o leitor mais exigente apresento abaixo uma comparação
da distribuição de cada uma das variáveis entre os países de alto crescimento e
baixo crescimento. O retângulo mostra os valores medianos para grupo, abaixo do
retângulo estão os 25% menores valores observados e acima do retângulo estão os
25% maiores valores observado, a linha em negrito dentro do retângulo representa
mediana de cada grupo. Os pontinhos acima e abaixo das retas são valores
extremos e a bola azul é a média de cada distribuição. O nome desse tipo de
representação é boxplot, já usei outras vezes aqui no blog por ser uma maneira
simples de representar características importantes de uma distribuição.
Comecemos com a distribuição de horas trabalhadas. Nos
países que cresceram muito as pessoas trabalham em média 2014 horas por ano,
nos países que cresceram pouco foram em média 1885 horas trabalhadas por ano. A
figura abaixo mostra que também a mediana também foi maior nos países de alto
crescimento. Note também que o caso extremamente alto que ocorreu nos países de
baixo crescimento seria normal nos países de alto crescimento. Por fim repare
que existem mais casos extremamente altos no grupo de países de alto
crescimento do que no grupo de países de baixo crescimento.
A próxima variável é a taxa de investimento. Repare que os
países que cresceram mais também investiram mais, nenhuma surpresa, repare
também que vários países do grupo de crescimento alto tiveram valores extremos
para taxa de investimento. Por conta disso o leitor talvez queira ver as
densidades, a figura seguinte atende a curiosidade do leitor. Repare que os países
de baixo crescimento (em laranja) são mais frequentes nas baixas taxas de
investimento, à medida que a taxa de investimento aumenta as barras laranjas
vão ficando maiores, depois ocorre uma pequena reversão, e nas taxas mais altas
de investimento as barras laranjas praticamente desaparecem.
Na sequência vem o consumo do governo como proporção do PIB.
Repare que dessa vez é o grupo de crescimento baixo que está cheio de valores
extremos altos, ou seja, vários países onde o governo gasta demais em
comparação com o da amostra. A figura seguinte é equivalente à do caso
anterior, porém agora repare que são as barras verdes que desaparecem nos
valores mais altos deixando apenas as barras laranjas, apenas países do grupo
de baixo crescimento tiveram governos consumindo mais de 50% do PIB.
A última variável é o grau de abertura. Talvez essa tenha
sido a variável mais confusa, ambas as distribuições apresentaram muitos
valores extremos, alguns países do grupo de crescimento baixo apresentaram
valores para o grau de abertura maiores que os dos países de crescimento alto.
Porém ainda vale que tanto a média quanto a mediana do grupo de países de alto crescimento
são maiores que as do grupo de países de baixo crescimento.
O post não permite dizer que o segredo do crescimento seja trabalhar muito, investir muito, ter um governo menor e abrir mais a economia, porém definitivamente o post mostra que os países que cresceram mais, em média, trabalharam mais, investiram mais, tinham governo menores e economias mais abertas. Cada um que tire suas conclusões.
A primeira tabela mostra o oposto do que você disse para horas trabalhados e taxa de investimento. Os países que menos cresceram trabalharam mais e investiram mais, conforme sua tabela.
ResponderExcluirEstava errado na tabela, muito obrigado por avisar. Já corrigi.
ExcluirParabéns por mais um belo texto.Estou cada dia mais confuso do que realmente leva uma nação ao crescimento.Tudo leva crer que estes fatores que citastes tem tudo haver.No livro do A. Sacchida diz que o que leva o crescimento são as instituições-liberdade econômica.Há uma teoria das instituições extrativistas e inclusivas, e por aí vai.Gosto muito de olhar para nações que foram devastadas e hoje são potencias mundiais como Japão e Alemanha por exemplo.Quando comparamos Coreia e Brasil é só triteza.Qual o segredo dessas 3 nações que deram certo e o segredo do nosso fracasso?De outro lado, se não sei o que leva ao crescimento, sei de um exemplo fadado ao descrescimento:O Brasil.
ResponderExcluirAbraços!!!
Países ricos tendem a trabalhar menos, a ter Estados enormes, e não necessariamente investem muito. Ainda assim têm produtividade altíssima, o que é resultado do capital humano e de instituições eficientes. Países de renda média podem ter arranjos distintos, como estados grandes e alto investimento, embora trabalhem mais. E apresentam níveis diversos de crescimento, o que normalmente depende do tipo de instituições e da qualidade (não da quantidade) do Estado e de sua relação com o setor privado.
ResponderExcluirEnquanto isso, países de renda muito baixa provavelmente trabalham muito, investem muito como proporção do PIB, têm Estados minúsculos e provavelmente podem conviver com taxas médias de crescimento altíssimas no médio prazo.
Controlando para a renda, certamente esse seria o resultado. Isso quer dizer que o bom mesmo é ser a somália?
Embora o post argumente e lembre, corretamente, que não dá para propor nem de perto algo como um modelo de crescimento sem considerar a renda per capita inicial, a conclusão insinua que países que trabalham mais e tem estados menores tendem a crescer mais. Cá pra nós, a insinuação é fraca e não se sustenta. O nó da questão estava exatamente nas variáveis que deixaram de ser consideradas.
O nome disso em lógica é petição de princípios. Aliás, tecnicamente nem isso. Pois a conclusão contraria argumentos que estavam explicitamente no texto.