Reportagem da revista The Economist desta semana trata do
maior problema da economia brasileira: o baixíssimo crescimento da
produtividade (link aqui). Produtividade no Brasil é um tema que está na minha agenda de
pesquisa desde o final da década de 1990. Aqui no Blog já falei mais de uma vez
a respeito da produtividade. Porém com a reportagem da The Economist não
poderia deixar de voltar ao tema. O título da reportagem antecipa o que vem no
texto: “The 50-year snooze”, algo como “A soneca de 50 anos”. Se alguém ainda
fica com dúvida a respeito do que vem pela frente a imagem que ilustra a reportagem
é um sujeito deitado em uma rede olhando o que parece ser uma praia. Para os
que não se animaram de ler a reportagem o comentário feito pelo blog Selva Brasilis
deixa claro do que a The Economist está falando. Se você ficou cético a
respeito do Selva Brasilis esta frase tirada da reportagem coloca um ponto
final em qualquer dúvida: “The moment you land in Brazil you start wasting time”,
ou seja, “No momento que você pousa no Brasil você começa a perder tempo”.
Então a revista mostra os números de produtividade do trabalho no Brasil e
todos aqueles que já estavam pensando em exigir uma retratação começam a pensar
novamente, os números justificam o que foi dito. Somos um país que não se
preocupa com produtividade, ou, como diz a revista, a cultura de custo de
oportunidade está ausente do Brasil.
Para não repetir os números da revista resolvi apresentar números
alternativos, outros atores interpretando o mesmo roteiro. Em vez de produto
por pessoa empregada vou apresentar produto por hora trabalhada. Para isto peguei
o produto em preços nacionais constantes da Penn World Table 8.0 e dividi pelas
horas trabalhadas, para obter esta última multipliquei as goras médias trabalhadas
pelo número de pessoas trabalhando. Usei três países: Brasil, Coréia do Sul e
Estados Unidos. O Brasil é o caso de interesse, a Coréia do Sul é o exemplo de
sucesso e os Estados Unidos são a referência. A figura ao lado mostra a
produtividade do trabalho no Brasil e na Coréia do Sul como proporção da dos
EUA. Para os que não gostam de ler gráficos alguns números resume a história.
Em 1965 a produtividade do trabalho no Brasil era 15% da americana e a da
Coréia do Sul era 11% da americana, em 2011, a do Brasil era 17% da americana e
a da Coréia do Sul 50%. Enquanto a Coréia do Sul se aproximava da economia
líder o Brasil mal conseguia segui-la, dito de outra forma, enquanto a Coréia
do Sul se aproximou da fronteira de produção mundial o Brasil ficou mais ou
menos na mesma distância.
Outra medida de produtividade usada pelos economistas é a
chamada Produtividade Total dos Fatores, conhecida como PTF. Enquanto a
produtividade do trabalho é de fácil interpretação, representa o valor
produzido por hora de trabalho, a PTF não tem uma interpretação direta. Estritamente
falando a PTF representa a parte do produto que não é explicada por capital ou
por trabalho dada uma determinada função de produção. Como as medidas de
capital e de trabalho envolvem vários problemas e o próprio conceito de função
é, para dizer o mínimo, polêmico a interpretação da PTF é um exercício
delicado. Não por acaso a PTF também costuma ser chamada de medida de nossa
ignorância. Por conta de todas estas complexidades a Penn World Table só
apresenta a PTF com preços nacionais em índices (não recomendo usar os outros
preços para o Brasil). Desta forma não é possível comparar o nível da PTF entre
Brasil, Coréia do Sul e Estados Unidos, mas podemos comparar como a PTF cresceu
em cada um destes países. A figura ao lado mostra a PTF para os três países. Novamente
os resultados são cruéis para o Brasil. Nos EUA a PTF cresceu 38% entre 1965 e
2011, na Coréia do Sul a PTF cresceu 92% e no Brasil cresceu apenas 6%. Por
esta medida a Coréia do Sul mais uma vez mostra que está se aproximando da
economia líder, enquanto o Brasil está ficando mais longe do líder. Por mais
que a PTF seja questionável seu uso é interessante por apontar as ineficiências
de outros fatores, na produtividade do trabalho um acréscimo de capital, mesmo
que ineficiente, pode ser visto como ganho de produtividade, a PTF tenta
resolver este problema. Os números da PTF sugere que temos ineficiências no
capital e no trabalho. Alguém está surpreso? Eu não estou. Sempre haverá quem
prefira atacar o conceito de PTF enquanto finge que não temos ineficiência em
praticamente tudo, até parece que só a PTF denuncia estas ineficiências...
Os não economistas podem estar questionando quais os efeitos
práticos dessa discussão. Como estes conceitos afetam nossas vidas? Nos nossos
bolsos, respondo. O último gráfico mostra a evolução do PIB per-capita no
Brasil e na Coréia do Sul como proporção dos EUA. Em 1965 um coreano médio
tinha uma renda equivalente a 10% do americano médio, no mesmo ano o brasileiro
médio tinha uma renda que era 16% do americano médio. Em 2011 a situação era
outra, enquanto a renda do brasileiro médio 21% da renda do americano médio a coreano
era de 70%! .Tivéssemos conseguido crescer no ritmo da Coréia nossa renda hoje
seria, em média, o triplo da que de fato é. Considere os números que mostrei antes de aderir aos que vão
reclamar da The Economist ou tentar desviar o foco da discussão. Já passou da
hora do Brasil levar a sério a questão da produtividade. Ignorar que o problema
central da economia brasileira é a baixa produtividade e o baixo crescimento da
produtividade nos levará a repetir a história.
"Sempre haverá quem prefira atacar o conceito de PTF" -> Você tem algumas referências para indicar?
ResponderExcluirJá li algumas críticas acadêmicas sobre o conceito, Fragelli e Cavalcanti têm uma crítica à forma tradicional de calculá-la e propõem uma forma alternativa, mas em geral as críticas são muito curtas.
As críticas são várias, desde o conceito de função de produção agregada até as medidas de capital, trabalho e rendas dos fatores. Para a questão da medida de capital sugiro o artigo do Lant Pritchett (http://elibrary.worldbank.org/doi/book/10.1596/1813-9450-2341), para uma crítica a medida propriamente dita sugiro uma clássica: Jorgenson e Griliches, 1967 (http://faculty.apec.umn.edu/ppardey/APEC5721/Articles/Griliches%20&%20Jorgenson%201967%20RES%20--%20The%20Explanation%20of%20Productivity%20Change.pdf).
ExcluirObrigado!
ExcluirCaro Roberto Ellery, como sempre perfeito e oportuno seu comentário dado o momento político em que vivemos. Políticas socializantes são levadas a frente e não se fala sobre quem pagará a conta. Sabemos que o aumento salarial é um prêmio ao empenho do trabalhador pelo aumento da sua produtividade. Não obstante isso, já se fala de um salário mínimo de setecentos reais! E se o social é o foco, a (ausencia) de uma política educacional colabora para o desastre! É muita incompetência, misturada com fortes doses de ma fe e corrupção juntas!
ResponderExcluirO ponto que eles tentam ignorar é que sem aumento de produtividade não será possível sustentar os ganhos salariais das últimas décadas. Sei que tem bons economistas no governo que sabem disto, mas é preciso dar o passo adiante e passar a tratar produtividade como prioridade máxima.
ExcluirCaro,
ResponderExcluir1- Conserte, por favor, o "per capta" no gráfico. Os alunos podem copiar a grafia equivocada.
2- Como você explica a queda da PTF nos anos 90 no Brasil?
O que eu mais vejo no Brasil é trabalho inutil. Gente que ganha so para abrir portas, para anotar o peso do prato de comida, para distribuir senhas para filas, enfim, o Brasileiro que baixa renda não produz quase nada mesmo.
ResponderExcluirFiquei com uma dúvida em seu texto, sou leigo no assunto, mas me chamou atenção. O primeiro gráfico, de produtividade, é determinado pelos preços nacionais constantes da Penn World Table 8.0 divido pelas horas trabalhadas, correto? Portanto, o resultado não poderia indicar que os preços nacionais decresceram ao longo do tempo? Acho estranho um profissional de 2011 ter uma produtividade próxima a um a 40 anos atrás.
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