O padrão da inflação no Brasil é de queda até julho e subida a partir de agosto, esse padrão está associado a fatores não necessariamente relacionados à política econômica como safras e estações do ano, também pode ser afetado por reajustes salarias em algumas categorias e coisas do tipo. A figura abaixo mostra o padrão da inflação medida pelo IPCA no Brasil, são considerados três períodos: desde a estabilização (1996 a 2020), no século (2001 a 2020) e na década (2011 a 2020). A mudança significativa é que a subida em julho não está presente quando olhamos a década encerrada em 2020, não sei explicar por que o pico desapareceu, mas fica claro que a queda no primeiro semestre e subida no segundo semestre é um padrão presente em todos os períodos considerados.
A valer esse padrão a expectativa de aceleração da inflação
a partir de agosto, mas talvez esse não seja o caso. Choques ou decisões de políticas
econômicas podem fazer com a inflação de um determinado ano saia desse padrão.
O fato de o desenho da curva não ser consequência da política econômica não
quer dizer que a política econômica não possa mudar o desenho da curva.
Confuso, eu sei, mas imagine que existe um padrão natural que pode ser alterado
pela política econômica ou por choques que afetem a economia.
Um exemplo disso foi 2016, o ano do impeachment da Dilma.
Segundo o padrão das médias, naquele ano a inflação deveria ter começado uma
tendência de alta em agosto e chegado a dezembro mais alta do que em janeiro. Uma
olhada na figura abaixo é suficiente para ver que isso não aconteceu, para
facilitar o padrão das médias está na figura em azul escuro. Repare que não ocorreu
a tradicional subida do segundo semestre. A razão provável é que a mudança no
governo e política econômica levou a uma menor inflação esperada e isso jogou a
curva para baixo. A subida que começou em setembro foi bem modesta.
Outro ano que saiu do padrão foi 2020, o choque da pandemia
jogou a inflação para baixo já em abril e maio, nos dois meses a variação do
IPCA foi negativa, a subida começa a partir de maio e é bem mais forte que a do
padrão usual. Minha explicação para uma subida tão forte, mesmo com a pandemia
e as restrições à abertura do comércio, foi a condução da política monetária que
exagerou na redução dos juros e, mais importante, no tempo que segurou os juros
muito baixos. Aqui vale uma nota: o BC se comporta como a maioria dos bancos
centrais e usa juros como instrumento de política monetária, nesse sentido “aumentar
os juros” é o equivalente do “reduzir a oferta de moeda” que aparece nos livros
textos de macroeconomia. A figura abaixo mostra a inflação de 2020, mais uma
vez o padrão médio da década aparece em azul escuro para facilitar a
comparação.
O ano 2021 já começa como um ano fora de padrão. A segunda onda da pandemia mantém um alto nível de incerteza na economia e o BC começou uma reversão da política monetária com seguidos aumentos de 1% na meta para taxa Selic. A figura abaixo mostra a inflação em 2021 (até junho) e o padrão médio da década, a diferença é clara. Mesmo assim, tudo mais constante, acredito que o caminho natural seria uma elevação a partir de agosto ou, mais tardar, setembro, mas o “tudo mais” não está constante. A guinada na política monetária pode repetir 2016, sem a mudança de governo, e evitar, ou pelo menos suavizar muito, a elevação da inflação no segundo semestre. Para que isso aconteça é fundamental que sociedade acredite que o BC está disposto a dar um grande choque de juros se necessários for.
Olhando de fora do BC e do mercado acredito que o atual ciclo de elevação não passa a mensagem que o BC está disposto a fazer o que for preciso para segurar a inflação, mas pode ser porque sou chato. Como bom botafoguense sigo dizendo que vai dar errado e, lá no fundo, torcendo (e até acreditando) que pode dar certo.
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