Na semana passada o IBGE divulgou as contas nacionais referentes
ao primeiro semestre de 2018 (link aqui). O crescimento de 0,4% do PIB no primeiro
trimestre de 2018 não impressionou muita gente, não é de impressionar mesmo,
mas, uma olhada mais cuidadosa reforça a tese de uma recuperação lenta, porém
bem fundamentada. Como já disse outras vezes aqui no blog a pior coisa que pode
acontecer é uma recuperação rápida e estabanada, não precisamos de um espirro
de crescimento que termina em uma pneumonia.
A figura abaixo mostra a taxa de crescimento do PIB desde
1996. A linha mostra a taxa acumulada em quatro períodos, as colunas mostram o
crescimento do trimestre em relação ao trimestre anterior com o ajuste sazonal.
Na figura fica claro o mergulho que começamos a da a partir do segundo semestre
de 2014 e que chegou ao fundo no segundo trimestre de 2016. A partir daí começou
a lenta recuperação. No primeiro trimestre de 2017 tivemos o primeiro
crescimento em relação ao trimestre anterior depois de oito trimestres seguidos
de queda. No acumulado de quatro trimestres apenas no último trimestre de 2017
voltamos a ter taxas positivas.
Em relação ao trimestre anterior o crescimento mais forte
veio da agropecuária que cresceu 1,4%, a indústria e os serviços cresceram
0,1%. Na taxa acumulada em quatro trimestres a agropecuária também foi o
destaque crescendo 6,1%, a indústria cresceu 0,6% e os serviços cresceram 1%. Assim
visto os números sugerem um crescimento puxado pela agropecuária, mas a
impressão muda quando abrimos os números da indústria. A figura abaixo mostra a
taxa de crescimento do PIB e de setores da indústria, perceba que o crescimento
da indústria foi “puxado para baixo” pela construção civil e “puxado para cima”
pela indústria de transformação que cresceu mais que o dobro do PIB. Na
comparação do primeiro trimestre de 2018 com o primeiro trimestre de 2017 a
indústria de transformação cresceu 4,0% contra 1,6% do PIB.
De fato, como mostra a figura abaixo, a indústria de
transformação caiu mais rápido que o PIB quando da crise, mas vem se
recuperando mais rapidamente. Da minha parte destaco a indústria de transformação
por acreditar que seja o ramo da indústria mais sensível à política econômica.
Economistas desenvolvimentistas que costumam ver a indústria de transformação
como o setor dinâmico da economia e o único capaz de gerar inovação, ganhos de produtividade
e crescimento de longo prazo talvez estejam vendo uma recuperação ainda mais consistente
do que a que eu estou vendo. O outro setor da indústria que pode responder apolítica
econômica é a construção civil, esse setor cresceu muito no período anterior à
crise, muita gente chegou a falar de bolha imobiliária, e faz um ajuste necessário.
O governo poderia até induzir maiores taxas de crescimento do PIB com estímulos
mais fortes a esse setor, mas seria um erro grave que levaria a uma nova crise
em um futuro não tão distante.
Se a indústria de transformação vem mostrando um desempenho
superior ao do PIB o mesmo não pode ser dito a respeito do setor de serviços. No
acumulado de quatro trimestres os serviços cresceram 1% contra 1,3% do PIB, a
lenta recuperação dos serviços ajuda a entender a lenta recuperação do emprego
e da economia como um todo, os serviços correspondem a cerca de 60% do PIB. Os
dois destaques do setor de serviços foram o comércio, cresceu 3,4%, e os transportes,
cresceu 2,1%. A maior queda, 1,8%, foi em comunicações e informações.
Pelo lado da despesa o consumo das famílias cresceu 0,5% em
relação ao trimestre anterior e o investimento, medido pela formação bruta de
capital fixos (FBCF), cresceu 0,6%, o consumo do governo caiu 0,4%.
Considerando o acumulado em quatro trimestres o consumo das famílias cresceu
2,1%, o consumo do governo caiu 0,6% e a FBCF caiu 0,1%. A figura abaixo
ilustra o comportamento dessas variáveis.
A queda da formação da formação bruta de capital fixo no
acumulado de quatro trimestres é um indicador ruim, mas se levarmos em conta
que no primeiro semestre de 2016 a queda no acumulado de quatro trimestres foi
de 15,8% percebemos que a trajetória é de recuperação. Um fato relevante é que a
taxa de poupança bruta, 16,3%, ficou maior que a taxa de investimento, 16%. A
turma que não gosta de poupança externa deve estar satisfeita.
Em resumo temos uma recuperação lenta, mas consistente. O
crescimento da indústria de transformação acima do PIB sugere que não estamos
sendo apenas puxados pelo resto do mundo e que a economia está respondendo às
políticas locais. A recuperação do investimento, ainda que lenta, reforça a
tese de recuperação lenta e consistente. O leitor atento notou algumas provocações
no decorrer do texto, é mais forte do que eu, por mais que os números sejam
relativos a um pequeno período de tempo e possam mudar rapidamente não deixa de
ser irônico que a recuperação em um contexto de políticas “neoliberais”
apresente um crescimento da indústria de transformação acima do crescimento do PIB
e uma taxa de poupança bruta maior que a taxa de investimento, dois elementos
característicos das receitas desenvolvimentistas.
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