No último post comparei a dívida pública no Brasil com a dos
outros países na base de dados do FMI, nesse post vou comparar o gasto de nosso
governo com os gastos dos governos dos outros países. Assim como o post
anterior esse post foi motivado pelo debate em torno da PEC do teto dos gastos,
tenho visto muita gente dizendo que não temos problemas de gastos, nosso
problema foi a queda na receita. É certo que sem a queda da receita que
acompanhou a crise econômica não estaríamos com tanta urgência para o ajuste fiscal,
porém essa leitura não aborda a questão do tamanho do gasto propriamente dito.
Quando muito diz que quando a economia está crescendo é possível manter o nível
de gastos do nosso governo, não diz se é desejável ou se é viável manter a
economia crescendo com o governo gastando quase 40% do PIB. Menos do que dizer
se o nível de gasto no Brasil é desejável ou viável (creio que não viável nem
desejável, mas isso é assunto para outra conversa) o objetivo do post é avaliar
o gasto do governo brasileiro em relação ao gasto dos governos de outros
países.
Comecemos olhando o gasto por grupos de países conforme
definidos pelo FMI, mais uma vez os países com menos de cinco milhões de
habitantes foram excluídos da amostra e foi considerada a média dos valores observados
nos anos de 2011 a 2015, os dados estão disponíveis na página do FMI. O grupo
com maior gasto médio do governo é o de países avançados (41,9%), depois vem os
emergentes da Europa (40,5%), esses são os únicos dois grupos onde o gasto
médio supera o do Brasil (38,7%), todos os outros grupos possuem gastos médios
do governo inferiores ao do Brasil. No grupo a que pertencemos, América Latina
e Caribe, o gasto médio é de apenas 28,2%. Nosso governo é um latino que gasta
como um europeu. A figura abaixo mostra o gasto médio de cada grupo, repare que
apenas duas colunas ultrapassam os 38,7% do Brasil.
A figura abaixo mostra o gasto do governo como proporção do
PIB e a renda per capita dos diversos países da amostra. Assim como no caso da
dívida o Brasil aparece bem acima da reta, ou seja, nos países onde a renda per
capita é próxima à do Brasil ($15,6 mil) o governo gasta uma proporção do PIB
bem menor que os 38,7% gastos por aqui. Repare que boa parte dos países onde o governo
gasta uma proporção do PIB maior que no Brasil sã países avançados.
Para observar melhor o Brasil a figura abaixo retira da
amostra os países avançados e os países do Oriente Médio. É fácil ver que na
grande maioria dos países emergentes o governo gasta uma proporção do PIB menor
do que é gasto no Brasil, de fato, dos 74 países representados na figura apenas
em nove o governo gasta mais que o do Brasil como proporção do PIB, são eles:
Hungria, Ucrânia, Sérvia, Polônia, Equador, Venezuela, Bielorrússia, Bolívia e
o Quirguistão. Não custa lembrar que os três latinos do grupo são países que
aderiram em algum grau ao bolivarianismo de origem venezuelana.
A figura abaixo mostra apenas os países da América Latina e
Caribe. Fica claro como o governo brasileiro gasta mais do que o padrão dos
outros governos de “nuestra” América. Em nenhum país da América Central o
governo gasta uma parte do PIB maior que no Brasil, na América do Sul apenas
Equador, Bolívia e Venezuela possuem governos mais gastadores que o nosso. No
México, um país grande e com renda per capita próxima à do Brasil, o governo
gasta apenas 27,7% do PIB. No Chile, o eterno exemplo se sucesso no continente,
o governo gasta 23,9% do PIB. Apesar dos governos do México e do Chile gastarem
menos que o nosso em proporção ao PIB ambos os países estão na nossa frente no
PISA (ranking que mede a qualidade da educação) e no IDH (medida de qualidade
de vida).
Para terminar vale dar uma olhada no comportamento do gasto
do governo no Brasil ao longo do tempo. Desde 1996, primeiro ano da amostra do
FMI, até o final da amostra incluindo o período estimado, o gasto de nosso
governo ficou entre 35% e 40% do PIB. É muito. Um gasto de 35% do PIB é maior
que a média dos países da Comunidade Independente de Estados (os governos dos antigos
membros da União Soviética gastam menos que o nosso!), do Oriente Médio, da
América Latina e Caribe, do Sub-Saara e do Emergentes da Ásia, grupo que
costuma ser um celeiro de milagres econômicos e onde a média de gastos do
governo é de 23,2% do PIB. Repare que mesmo acontecendo o ajuste fiscal
previsto pelo FMI, em 2021 o governo gastará uma proporção do PIB maior que a
já alta média do período 2011-2015.
Podemos continuar tampando o sol com a peneira alegando que
nosso governo gasta pouco e o problema é a crise, também podemos continuar
buscando novas vítimas para pagar a conta do governo. Porém, enquanto falamos
de novos impostos ou buscamos saídas mágicas para nossos problemas continua
valendo que o governo brasileiro gasta bem mais que o governo de países semelhantes
ao Brasil. Como proporção do PIB entre 2011 e 2015 gastamos mais que a Rússia
(35,1%), a China (29,2%) e os Estados Unidos (36,7%), países onde os governos
financiam gigantescas máquinas de guerra, só isso já deveria ser motivo para
questionarmos se nosso governo não gastando demais.
É claro que existe uma demanda gigantesca por mais gastos
públicos, mas não deve ser diferente nos outros países com renda semelhante à
nossa. O ponto é que para gastar mais o governo precisa tirar mais recursos das
famílias e das empresas, talvez nossas famílias e nossas empresas não tenham
tanto dinheiro para dar ao governo sem comprometer o funcionamento de nossa
economia.
Olá roberto,
ResponderExcluirVenho visto que os gastos do governo rondam 16%, podes me explicar como chegou nos 38,7%?
Muito boa análise
Roberto, por que não reduzir os gastos com o pagamento de juros da SELIC? Muitos dizem que não é possível reduzir a SELIC devido ao Risco Brasil, porém o Brasil possui o maior juros real do mundo e é o dobro do segundo colocado. Que risco é este que é necessário oferecer o dobro de juros do segundo colocado para paga-lo? E por que este risco não é mencionado na ata do COPOM como justificativa para não reduzir a SELIC? Segundo o último Relatório de Estabilidade Financeira do Banco Central, o nível de inadimplência do setor público é menor do que 3%. Este índice vem crescendo assim como a dívida, o que representa um aumento do Risco Brasil. Por isso precisamos ter o maior juros real do mundo, mas isto não é justificativa para que seja tão acima dos outros. O fato é que a real justificativa é a busca pela meta da inflação. Porém há uma contradição na atuação do BC na busca pela meta. A elevação do juros combate a inflação única e exclusivamente através da valorização cambial e o BC eleva o juros e realiza operações de swap cambial reverso para impedir a valorização cambial. Qual o sentido disto? A teoria de combater a inflação reduzindo a demanda pelo encarecimento do consumo não considera que a elevação do juros também reduz a oferta ao aumentar o custo de oportunidade. Portanto, demanda e oferta reduzem juntas, o que não combate a inflação e gera recessão, caso não deixe o câmbio valorizar. Considerando tudo isso, não há razão para não economizarmos reduzindo o juros e até as swaps cambiais uma vez que temos uma reserva internacional de US$370 bi. Há algum erro no meu raciocínio?
ResponderExcluirO que mais me preocupou hoje foi a notícia de que o governo federal estimulará os estados a buscarem empréstimos no exterior para "evitar o colapso". Sinto um cheiro de naftalina nisso. Na prática os estados voltarão a emitir títulos, o que também já vimos.Quem viveu nos anos 80 e começo dos 90 tem uma memória amarga disso......
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