A avaliação de políticas de crescimento econômico é sempre
um exercício complicado. Além de exigir horizontes de tempo longos exige uma
série de outros cuidados que torna o trabalho do avaliador quase impossível.
Suponha que no início da década de 1950 um determinado país tenha implementado
uma determinada política de crescimento e que após 60 anos este país continue
pobre. É possível afirmar que a política falhou? Não.
Primeiro o avaliador teria de saber se a política foi
interrompida. Depois é preciso saber se outras políticas foram utilizadas no
país ou se algumas características do país fizeram com que a política não
funcionasse. Existem várias técnicas econométricas para tratar destas questões,
nenhuma é a prova de erros. Resta então a quem queira avaliar políticas de
crescimento buscar o maior número possível de países na esperança de que se
vários países adotaram políticas semelhantes com resultados semelhantes então o
resultado é devido à política. Claro que este tipo abordagem não oferece
respostas definitivas, é sempre possível que todos os países tenham sofrido
efeitos não relacionados com a política e que estes efeitos sejam responsáveis
pelo resultado observado. Entretanto se um número grande de países adotou
determinadas política e todos tiveram resultados semelhantes no mínimo é de se
esperar que os defensores da política expliquem o que acontece antes de sair
pedindo a reedição desta política.
A América Latina oferece um exemplo interessante. Na segunda
metade do século XX praticamente todos os países da América Latina adotaram
políticas de estimular a produção industrial local como forma de estimular o
crescimento. A tese de que este estímulo era a chave do crescimento estava
fundada em estudos da Comissão Econômica para América Latina e Caribe (CEPAL).
Grosso modo a ideia da CEPAL era que os preços das matérias primas (agrícolas e
minerais) tendiam a cair em relação ao preço dos bens industrializados. Desta
forma um produtor de soja teria de dar cada vez mais sacas de soja para obter
um automóvel ou uma televisão. A conclusão imediata era que um país que só
produza matérias primas tenderia a ficar cada vez mais pobre em relação a um
país que produza bens industrializados.
Para conseguir estimular a produção industrial os países da
América Latina seguiram uma estratégia conhecida como substituição de importações.
A ideia era simples: o país proibia a importação de um determinado bem industrializado
e usava recursos públicos para subsidiar a produção deste bem no território do
país. A indústria automobilística brasileira é um exemplo de como isto
aconteceu, até o início da década de 1990 importar um automóvel no Brasil era praticamente
impossível. Esta estratégia foi seguida por vários países do final da II Guerra
Mundial ao final da década de 1980. Foram quase 40 anos de aplicação de uma
política por vários países distintos. A figura abaixo mostra o resultado.
A figura mostra a renda média de países selecionados da
América Latina como proporção da renda média dos EUA, quando a linha da figura
está subindo o país está crescendo mais do que os EUA, quando está caindo o
país está crescendo menos que os EUA. Entre 1951 e 2010 apenas Brasil, Chile,
Colômbia e México cresceram mais dos que os EUA. Entre 1951 e 1990, que vou chamar
de período desenvolvimentista, apenas Brasil, México e Paraguai cresceram mais
do que os EUA, sendo que nos dois últimos ficaram praticamente estáveis. Entre
1990 e 2010, que vou chamar período das reformas, todos, com exceção do
Paraguai e do México cresceram mais do que os EUA. Como de 2000 a 2010, apesar
da previsão Cepalina de queda de preços das matérias primas, ocorreu um aumento
gigantesco nos preços das matérias primas muitas das quais produzidas nos
países da América Latina fica difícil analisar o período das reformas. Mas o
fracasso do desenvolvimentismo é evidente: quarenta anos de políticas de
incentivos à indústria foram incapazes de fazer com que a América Latina se
aproximasse dos EUA, pelo contrário, ficamos mais distantes. A guisa de comparação
a renda média da Coréia do Sul em 1954 era 10% da dos EUA, em 1990 era 40% e em
2010 era de 61%.
Defensores do desenvolvimentismo são rápidos em dizer que a
Coréia do Sul também incentivou a indústria, o que é um fato. Infelizmente não
são tão rápidos em explicar por qual razão lá a política de incentivos
estimulou (ou não atrapalhou, dependendo do analista) o crescimento lá e aqui
não. Retomar o desenvolvimentismo, como tem sido feito por vários governos da
América Latina, sem entender o que aconteceu no passado é uma aventura cara e
perigosa. Usar dinheiro dos impostos pagos pelas populações muitas vezes
miseráveis de nuestra América para financiar empresários sob a promessa que
estes empresários vão nos levar ao sonhado desenvolvimento econômico é ter mais
ingenuidade do que me parece aceitável. Nossa experiência mostrou que os beneficiários
destas políticas não pensam duas vezes antes de apoiar ditadores de ocasião à
primeira ameaça de uma mudança nas regras do jogo que diminua as benesses dos
incentivos e do protecionismo. Vamos arriscar de novo? Por que desta vez será
diferente?
Muito bom
ResponderExcluirIrineu
Obrigado meu caro. Quando você vier ao Brasil me avisa para ver se marcamos um seminário/conversa aqui na UnB. Grande abraço.
ExcluirÓtimo post, Roberto. Parabéns!
ResponderExcluirUma coisa mais. Acabei de encomendar desde a Espanha o livro Desenvolvimento Econômico (Ferreira, Giambiagi e outros), que acho conheces bem :-). O preço final ficou um pouco alto por causa do frete, mas acho que merece a pena o esforço financeiro...porque merece a pena, né? :-)
Espero que valha a pena. Eu gosto muito do livro, mas sou suspeito. Caso queira trocar ideias sobre o capítulo que eu e o Arilton escrevemos me avisa. O capítulo é um resumo de uma série de artigos que escrevemos. Abraço.
ExcluirEspero que valha a pena. Eu gosto muito do livro, mas sou suspeito. Caso queira trocar ideias sobre o capítulo que eu e o Arilton escrevemos me avisa. O capítulo é um resumo de uma série de artigos que escrevemos. Abraço.
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