Esta semana foi muito corrida e não pude dar atenção ao
blog, acontece. Porém entre viagens e esperas de reuniões consegui ler o Panoramada Indústria de Transformação Brasileira, recém lançado pela FIESP e um textodo José Oreiro e do Nelson Marconi sobre o que eles chamam de teses ortodoxas arespeito da desindustrizalização brasileira. O texto da FIESP é motivado pelo
fenômeno ilustrado do Gráfico 1 do texto e que está reproduzido abaixo.
Fica bem claro que a participação da indústria de transformação
no PIB está voltando aos níveis pré-JK. Também é possível observar que este
fenômeno começou antes da abertura da economia, antes da estabilização macroeconômica
com juros altos e câmbio valorizado e antes da Constituição de 1988. Sendo
anterior a estes fenômenos, a prudência recomenda que explicações para queda da
participação da indústria no PIB não dependam de nenhum destes fenômenos. Qual
seria então a explicação para esta queda? Oreiro e Marconi citam dez teses que
eles consideram englobar o pensamento ortodoxo sobre o tema e que eles
consideram equivocadas. As teses são:
1. A desindustrialização é um fenômeno mundial.
2. A economia brasileira não está se desindustrializando.
3. A desindustrialização brasileira é decorrência natural do seu
estágio de desenvolvimento
4. A indústria é um setor como outro qualquer.
5. O caso da Austrália mostra que a industrialização não é
fundamental para um país se tornar membro do primeiro mundo.
6. A desindustrialização brasileira não se deve a apreciação da
taxa de câmbio.
7. A apreciação cambial no Brasil é similar a dos demais países
emergentes.
8. A perda de competitividade da indústria brasileira deve-se ao
baixo dinamismo da produtividade e ao crescimento dos salários.
9. A apreciação cambial é decorrente da implementação do “Estado
do Bem-Estar Social”.
10. O câmbio
apreciado veio pra ficar.
Como eles mesmos reconhecem as teses não são necessariamente
consistentes entre si, posto que defendidas por autores diferentes, mas também
não são mutuamente exclusivas entre si, embora possam ser aos pares.
Estritamente falando apenas as teses 3 e 8 tentam explicar a desindustrialização.
A tese 1 se limita a contextualizar sem explicar o fenômeno. A tese 2 nega o
fenômeno. As teses 4 e 5 dizem que o fenômeno não é relevante mas não tratam da
existência ou natureza do fenômeno. A tese 6 fala sobre o que não é causa, mas
não tenta explicar qual a causa. As teses 7, 8 e 10 tratam do câmbio e não da
indústria. Naturalmente conhecendo a opinião dos autores sobre industrialização
é possível inferir que estes veem o câmbio como variável fundamental para
explicar a participação da indústria no PIB e, portanto, ao tentar explicar o
câmbio as teses 7, 8 e 10 também explicariam a queda desta participação. Mas
isto só é verdade se aceitarmos que a taxa de câmbio explica a participação da
indústria no PIB, o que não é consenso entre economistas e particularmente não
é consenso entre economistas ortodoxos que, afinal, seriam os autores das
teses.
Desta forma teses propriamente ditas são duas:
3. A desindustrialização brasileira é decorrência natural do seu
estágio de desenvolvimento
8. A perda de competitividade da indústria brasileira deve-se ao
baixo dinamismo da produtividade e ao crescimento dos salários.
A terceira tese é interessante, mas da forma que está
escrita não me comove muito. Sou meio cético a respeito de teorias que envolvem
estágios de crescimento para tratar da indústria. No texto eles apresentam o
problema de forma mais interessante, particularmente concordo que o aumento da
renda per-capita explica parte da queda da participação da indústria no PIB. A
oitava tese tem uma casca de banana. A parte do baixo dinamismo da
produtividade está perfeita a parte dos baixos salários é controversa, alguém
poderia reescrever a tese como: “Crescimento dos salários acima do crescimento
da produtividade do trabalho” e não estaria mentindo se dissesse que é uma tese
defendida por economistas heterodoxos à
la Kaldor. Que fique claro que eu concordo que o baixo crescimento da produtividade é parte do
problema.
Fiz esta introdução para apresentar outra tese a respeito da
queda da participação da indústria de transformação no PIB, não vou dizer que é
minha tese porque imagino que mais gente por aí já tenha dito o mesmo. Eis a
tese:
Os fundamentos da
economia brasileira (preferências, tecnologia, dotações e instituições) são
tais que em equilíbrio a participação da indústria no PIB é baixa. O atual
fenômeno nada mais é que um retorno ao equilíbrio após anos fora do equilíbrio
devido a políticas pró-indústria.
Não é uma tese sem implicações. Vou falar sobre duas, no
futuro escreverei em defesa da tese. A primeira implicação é que se o Brasil
pretende reverter este fenômeno deve mudar os fundamentos da economia. Como
querer indústria em um país com um dos piores sistemas de educação do mundo e
onde é mais fácil ficar rico nos bastidores de Brasília do que empreendendo?
Sem capital humano não tem produtividade e sem produtividade não tem indústria
sustentável. A ideia do trabalhador-cliente que sustenta o processo de
industrialização só faz sentido se este trabalhador for produtivo o suficiente para
ter uma renda que o permita ser consumidor. De certa forma estou falando da
tese 8, porém com ênfase na produtividade e não no salário. A outra implicação
é que, sem mudanças nos fundamentos da economia brasileira, a queda da participação
da indústria representa um retorno ao equilíbrio e, portanto, a princípio é
desejável. Sendo desejável não deve ser combatida pelo governo.
Em resumo acredito que a participação da indústria de
transformação na economia é uma variável endógena. Desta forma não deve ser
objeto direto de políticas econômicas. Se é para ter uma indústria mais forte
então que se mudem os fundamentos da economia da economia brasileira, do
contrário estaremos condenados a ciclos de aumento e queda da indústria.
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