terça-feira, 6 de agosto de 2013

Oferta, Demanda e o Erro de Diagnóstico de 2011.

Parte dos economistas do governo insiste que o Brasil tem um problema de demanda, segundo estes economistas é preciso que o governo use de política monetária e fiscal para estimular a demanda como forma de gerar mais crescimento. À bem da verdade é preciso dizer que a parcela de economistas que insistem no diagnóstico de demanda caiu nos últimos tempos e já é bem reduzida. Há alguns anos os que insistíamos que o problema estava na oferta éramos bem poucos, não mais que um punhado de acadêmicos e economistas de mercado dispostos a enfrentar a opinião do governo (aqui cabe uma deferência a Alexandre Schwartsman do blog A Mão Visível, é fácil “bater de frente” com o governo quando se está protegido pela academia, o que não era e não é o caso dele e ao meu amigo Adolfo Sachsida que não se intimidou mesmo estando no IPEA). Com o tempo analistas de mercado se juntaram ao coro da oferta, o front acadêmico aumentou e vários economistas de renome falaram publicamente que o problema era a oferta. Os reforços fizeram efeito e mesmo dentro do governo começou a se falar de oferta. Medidas como a Lei dos Portos e as privatizações concessões entraram na agenda do governo. O Banco Central perdeu o medo de segurar a demanda e começou a elevar a taxa de juros. Enfim, começamos, ainda que timidamente, a buscar o caminho certo.

Entretanto vozes influentes no governo ainda pressionam por políticas de demanda. O coro fica mais alto cada vez que o COPOM aumenta os juros ou saem resultados de baixo crescimento. Já expliquei várias vezes que uma economia próxima ao pleno emprego vai crescer tanto quanto cresce a produtividade, o motivo é simples, sem ninguém para contratar a única forma de aumentar a produção é aumentando o quanto cada trabalhador produz. Como a produtividade no Brasil cresce a uma taxa baixa, a economia brasileira cresce a uma taxa baixa. Mas não é disso que vou falar neste post. O ponto do post é ilustrar, mais uma vez, que o que impede a economia brasileira de crescer é a oferta, não a demanda, e explorar um pouco as consequências do crescimento da demanda acima da oferta. A figura abaixo ilustra o primeiro ponto.




Na figura as barras azuis escuras mostram o crescimento do gasto no Brasil (C+I+G, para os que estudaram contabilidade nacional) entre 2001 e 2012, as barras em azul claro mostram o crescimento do PIB. Notem que a partir de 2005 a economia brasileira apresentou crescimento dos gastos maiores que crescimento do PIB em todos os anos exceto 2011. Na prática isto significa que desde 2005, com exceção de 2011, estamos aumentando nossos gastos mais do que aumentamos nossa produção. É como se uma família aumentasse sua despesa mais do que aumenta sua renda. No primeiro momento a família vai ter um ganho de bem estar por estar gastando mais. Em algum momento no futuro a despesa terá de ser paga e a família vai passar por momentos difíceis, não necessariamente, eu sei, volto a este ponto no final. A segunda figura ilustra este fenômeno.



Até 2005 o Brasil produzia mais do que gastava, isto permitiu que acumulássemos recursos para o futuro. A partir de 2005 o padrão começou a mudar, a despesa começou a subir mais do que a produção e nossa “poupança” começou a cair. Até então estávamos guardando menos para o futuro. Em 2009 começamos a gastar o que tínhamos “poupado”, naquele momento foi uma escolha justificável. O mundo estava em crise e praticamente nenhum governo pensa no futuro quando o desastre bate à porta. Claro que do conforto da sala de aula, sem ter que tomar decisões, eu pude criticar as medidas de 2008/09, mas não sou cínico o suficiente para dizer que não concordaria com medidas semelhantes se eu estivesse no governo. Daí vem 2010, anos de eleições, a prudência econômica dizia que era o momento de começar o ajuste, mas a estratégia política dizia o contrário. Como não raro acontece o bom senso eleitoral foi mais convincente que o bom senso econômico e o governo optou por adiar o ajuste.

Em 2011 não havia mais desculpas para adiar o ajuste. Primeiro ano de mandato presidencial, maioria folgada no Congresso e popularidade em alta. Era momento perfeito para apertar o cinto e levar o Brasil a voltar a gastar menos do que produzimos. O governo até tentou, em 2011 o gasto cresceu menos que o PIB, mas ao primeiro sinal de problemas o governo recuou e, com aplausos de vários economistas, investiu ainda mais nos estímulos à demanda. Foi um erro grave que teve origem na confusão entre determinantes do crescimento de uma economia com desemprego alto e os determinantes do crescimento de uma economia com desemprego baixo. Uma das consequências do erro é que hoje precisamos de um ajuste muito maior do que o necessário em 2011, mas pode piorar. Ainda não gastamos tudo que guardamos para o futuro, note que a área positiva é maior que a negativa, mas estamos caminhando para isto. Pior, guardamos quando as taxas de juros mundiais estavam baixas e corremos o risco de ter de “pegar emprestado” quando as taxas de juros estiverem altas. É a receita para o desastre.


Um último ponto, falei acima que não necessariamente gastar mais do que se tem leva a dias difíceis no futuro. Isto acontece guando o gasto é feito em atividades que aumentarão a renda futura mais do que os juros aumentarão as dividas. É o caso de um empreendedor que se endivida para fazer seu negócio ou de um jovem que se endivida para fazer um curso superior que aumentará muito seu salário. Infelizmente, uma rápida olhada na economia brasileira mostra que não foi isto que aconteceu: não investimos em infraestrutura, não melhoramos a educação e nem mesmo fizemos as reformas necessárias para aumentar a produtividade. Nós fomos do tipo irresponsável.

2 comentários:

  1. Muito didático! Obrigado pelo post!

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  2. Segundo o relatório trimestral de inflação do BC desde 2008 só em 2011 a política fiscal foi contracionista (no conceito de resultado estrutural). O BC projeta que o impulso fiscal será neutro ou contracionista. Dá pra comprar essa expectativa? E com eleições ano que vem, o que será de nós? E quais os motivos objetivos e racionais do governo insistir em pressionar a demanda, já que não aumenta o produto e só causará inflação? Rigidez de preços e salários explica isso? Ou é jumentice mesmo?

    E se Dilma for reeleita IPCA = 4.5% só por intervenção divina, concorda?

    Abraço

    Alexandre



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