Em janeiro de 2014 fiz um post aqui no blog onde comentei o sorriso da Selic (link aqui). Usei a expressão para comentar o processo de queda e alta da Selic que ocorreu naquela época. O ponto do post era que para reduzir a Selic seriam necessárias reformas que tornassem a economia brasileira compatível com baixas taxas de juros, especialmente reformas que ajustassem a trajetória do gasto, a um equilíbrio que dispensasse o Banco Central de manter juros altos (conceito delicado, mas creio que dá para entender) sem pressionar a inflação.
Quando o BC começou a reduzir juros em 2016, ainda com Ilan
Goldfjan no comando, pensei que repetiríamos a trajetória de juros com o jeito
de sorriso. Estava errado, minha explicação é que na época subestimei o impacto
do novo regime fiscal (aka teto de gastos ou PEC do fim do mundo) na formação
de expectativas. O teto realmente “vendeu” a ideia de mudança para um regime
onde seria possível manter a inflação controlada com juros mais baixos. O BC
viu muito melhor e mais longe do que eu, é do jogo, passei a brincar dizendo
que Ilan ‘Chuck Norris’ Goldfjan não precisava baixar a inflação, era a
inflação que se baixava quando ele passava.
Em 2019 o BC voltou a uma trajetória de redução de juros, eu
voltei a alertar para o risco de repetir a experiência do governo Dilma e aparecer
um novo sorrido da Selic. Amigos me alertaram que a reforma da previdência podia
ter mudado o equilíbrio, era uma hipótese, mas não me convenci completamente.
Minha leitura era que a reforma da previdência tinha sido “precificada” quando
da aprovação do teto de gastos. Com a pandemia a situação fiscal piorou muito.
O aumento de gastos era inevitável, mas isso não muda o fato de que a situação
fiscal, que já era ruim, foi agravada. A resposta inicial do BC me incomodou,
mas havia uma boa causa em defesa da continuidade da redução de juros, ninguém
sabia bem o que era a pandemia e, no primeiro momento, o “fique em casa” retraiu
a demanda. O efeito imediato dessa retração foi a queda de preços em abril e
maio do ano passado.
Com o passar do tempo foi ficando mais claro que a maior
parte do que estávamos vivendo era um choque de oferta, a insistência do BC em
segurar os juros em um patamar muito baixo começou a me incomodar mais a cada
reunião do Copom e eu fiquei mais vocal sobre o assunto. Infelizmente, como em
2012/14 e ao contrário de 2016/18, desta vez a Selic sorriu. A figura abaixo
mostra Selic desde 2011 e destaca os dois sorrisos com um círculo vermelho.
O que acontece daqui em diante? A resposta depende dos rumos
da política econômica, já sabemos que com o teto é possível controlar a
inflação com a Selic em torno de 6,5% ao ano. Com a piora da situação fiscal
imagino que seja necessária uma Selic um pouco maior. A questão central é se
será possível manter o teto de pé, especialmente com a proximidade de eleições
presidenciais. Caso não seja, a meta da Selic para manter a inflação controlada
deve ser bem maior que 6,5%, tanto maior quanto maior for o rombo do lado
fiscal. Para complicar ainda mais, o risco de dominância fiscal é bem maior do
que era em 2017, é possível que a elevação da Selic tenha um teto mais baixo do
que o necessário para controlar a inflação.
Em qualquer caso é fundamental que a sociedade acredite que
o BC vai levar a meta da Selic onde for preciso para controlar a inflação,
mesmo que isso signifique voltar a faixa de 14% pré-teto ou ainda mais alto.
Como o BC vai fazer para passar essa credibilidade diante do risco de explosão
da dívida e dominância fiscal? Não sei. Talvez seja melhor acelerar para 10%
agora do que esperar para ver até onde vai dar para chegar.
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