Muda governo e eu continuo fazendo a mesma coisa, sendo
chato. Na condição de chato resolvi procurar por algum período longo onde o
gasto público tivesse acompanhado a inflação sem que colhêssemos estabilidade e
crescimento. Parece que hoje a sorte estava do lado dos chatos e encontrei um
período que se encaixa perfeitamente no que eu procurava. Entre 1975 e 1985 o
gato público acompanhou a inflação, na realidade neste período o gasto cresceu
um pouco menos que inflação, espero que não seja preciso lembrar a ninguém o
aconteceu depois desse período, mas em todo caso vou lembrar: o fim do regime
militar e a chegada de um governo populista chegado a mágicas econômicas que
nos colocou em uma hiperinflação e não nos tirou da recessão, pelo contrário. A
figura abaixo mostra o índice preços, calculado pelo IGP-DI, a despesa federal
e a despesa total (federal + estadual + municipal), para que fosse possível visualizar
diferenças entre as séries tive de usar logaritmo e ajustar a escala. As séries
foram obtidas no Ipeadata.
Estou dizendo que os problemas posteriores a 1985 foram
causados pelo aumento do gasto ter acompanhado a inflação? Não! De jeito
nenhum! Nem por um segundo pense nisso. O que estou dizendo é que aumentar o
gasto de acordo com a inflação não é garantia de controlar a inflação e nem de
tirar país da crise. Pode ser uma condição necessária, mas não é suficiente.
Alguém está dizendo que é suficiente? Que eu saiba não. Então por que trazer o
assunto? Porque sou chato e porque é melhor prevenir do que remediar. Na
verdade, tem mais uma razão, deixar registrado que eu (nem ninguém que eu
conheça) disse que a regra de controle dos gastos iria nos tirar da crise e/ou
estabilizar a inflação. Sabe lá o que vão dizer no futuro...
Acredito que a decisão de limitar o crescimento do gasto foi
boa, mas não virá fácil. Existem vários elementos que dificultam colocar em
prática uma regra do tipo. Pressão de grupos de interesse é a mais óbvia, mas
existem outras, por exemplo, a medida que a população envelhece o gasto com
saúde e com previdência aumenta. De onde virão os cortes para bancar esse
aumento de gastos? Hoje a justiça obriga governos a pagar por tratamentos, vão
mudar a lei? Outro exemplo, várias carreiras do serviço público são
estruturadas de forma que o salário real dos servidores aumenta com o tempo,
isso cria uma tendência permanente de aumento real na folha de pagamento do
governo. E aí? De onde vão cortar para compensar esse aumento? Vão mudar as
carreiras? O problema é agravado pelo fato que vários servidores públicos estão
no regime jurídico único e têm direito a aposentadoria integral, a reposição desses
servidores implica em aumento real do gasto. Não vão repor tais servidores? Vão
mudar o regime de aposentadoria dos servidores que estão no regime jurídico
único?
As questões acima deixam claro, pelo menos para mim, que
para implementar a regra que impede aumentos reais nos gastos o governo terá de
aprovar uma série de reformas. Politicamente será um processo delicado e com
embates duros (é bom que seja assim!), nesse processo é preciso tomar cuidado
para não prometer milagres com o controle de gastos e nem recuar com as
reformas a ponto de impossibilitar a aplicação do controle de gastos. A última
coisa que precisamos é de um governo que precise de inflação para não cometer
crime de responsabilidade.
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