Esta semana as críticas à Lava Jato subiram de tom, parece
que a medida que os procuradores e delegados envolvidos na operação ampliam o
leque das investigações, atingindo o PMDB e o PSDB, as forças políticas se unem
contra a Lava Jato. Tal fenômeno era esperado e cabe à sociedade resistir fazendo
valer a tese de que tiramos Dilma e depois, se fosse o caso, tiraríamos os
outros. É o caso. Na guerra contra a Lava Jato vale tudo, de ameaças a
estabilidade da economia (ver link) a teorias a respeito de que a imprensa é
culpada pela sensação de que vivemos em um mar de lama.
A ideia que acobertar a corrupção possa de alguma forma ser
bom para economia chega a ser ofensiva. Boa parte dos avanços mais recentes da
teoria do crescimento econômico mostram que quanto mais inclusivas as instituições
de um país mais próspera será a economia deste país. É difícil não pensar a
corrupção com seus acordos de bastidores como exemplo de uma instituição extrativa,
é impossível não pensar que a transparência trazia pelos investigadores do
Ministério Público, mesmo com alguns exageros pontuais, é uma tentativa de
substituir instituições extrativas por instituições inclusivas.
Efeito parecido vale para a imprensa. Parece fácil pensar que a imprensa desestabiliza o país com tantas notícias de corrupção e
cair na tentação de que é preciso controlar a imprensa. Nada mais longe da realidade.
Uma imprensa livre é peça fundamental na construção da credibilidade das
instituições e leva a uma situação de mais estabilidade e menos corrupção no
longo prazo.
Para ilustrar meu ponto peguei os dados de liberdade de
imprensa do Repórteres sem Fronteira (Reporters without borders, link aqui) e os
dados de percepção da corrupção da Transparência Internacional (Transparency
International, link aqui). O primeiro é elaborado a partir de questionários
preenchidos por especialistas em 180 países que avalia indicadores de
pluralismo, independência da imprensa, ambiente e auto censura, legislação,
transparência infraestrutura e abusos. O segundo considera várias fontes de
informação e leva em conta a percepção de empresários e especialistas a
respeito da corrupção. A valer a tese que a imprensa é responsável pela sensação
de corrupção seria de se esperar que países com mais liberdade de imprensa tivessem
mais percepção de corrupção. Não é o que mostra a figura abaixo, pelo
contrário, quanto maior a liberdade de imprensa menor a percepção de corrupção.
Alguém poderia imaginar estarmos diante de um exemplo do
Paradoxo de Simpson (link aqui), que a relação da figura acima só existe porque misturamos
países com características diferentes. É uma hipótese, não nego, para verificar
se é o caso fiz a regressão para grupo de países. Em todos os grupos a relação
ficou negativa, mais liberdade de imprensa menos percepção de corrupção, apenas
nos países emergentes da Ásia e nos países emergentes da Europa a relação foi
não significativa, sendo que esse último grupo tem apenas cinco países o que
torna difícil achar qualquer relação significativa. A figura abaixo ilustra a
regressão por grupos.
Naturalmente a análise desse post não permite afirmar que
mais liberdade de imprensa causa menos percepção de corrupção, muito embora eu
acredite que seja o caso, pois, com o tempo, a sensação que a imprensa divulga
tudo o que acontece faz com que as pessoas acreditem mais nas instituições em
tempos que o noticiário policial não se confunde com o noticiário político. O
que a análise faz é dificultar um pouco mais a vida de quem quer calar a
imprensa em nome de uma ilusão de estabilidade e tranquilidade econômica. Assim
como em tanto outros casos, a perseguição de ilusões desse tipo pode ser fatal.
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