sexta-feira, 29 de maio de 2015

Resultados do PIB para o primeiro trimestre de 2015: A crise é grave e está cada vez mais difícil culpar o resto do mundo

Conforme esperado o PIB brasileiro encolheu no primeiro trimestre de 2015. Na comparação do primeiro trimestre de 2015 com o último trimestre de 2014 a queda foi de 0,2%, em termos anualizados, como é feito nos EUA, a retração seria de 0,78%. Comentarei de forma mais detalhada os números que comparam o primeiro trimestre de 2015 com o primeiro trimestre de 2014, porém um dado que acontece tanto na comparação do primeiro trimestre de 2015 com o último de 2014 quanto na comparação do primeiro de 2014 com o primeiro de 2015 é que o único componente da demanda que aumentou no primeiro trimestre de 2015 foram as exportações de bens e serviços. Imagino que o dado seja um tanto quanto embaraçoso para os que insistem em culpar o resto do mundo por nossa crise.

Na comparação do primeiro trimestre de 2015 com o primeiro trimestre de 2014 a retração foi de 1,6%. É uma queda expressiva que fica ainda mais grave quando observamos a composição do PIB. Pelo lado da oferta o primeiro fato a ser destacado é que mais uma vez a agropecuário nos salvou de uma queda ainda maior no PIB, o setor cresceu 4% puxado principalmente pela soja cujo a quantidade produzida aumentou 10,6% e a área plantada aumentou 4,7%. A indústria teve uma queda de 3% e o setor de serviços teve uma retração de 1,2%. A retração de 3% da indústria são não foi maior por conta do crescimento de 12,8% na indústria extrativa mineral, a indústria de transformação teve uma retração de 7,0%, fica ainda pior, a indústria de máquinas e equipamentos aparece na lista de destaques negativos, o que sugere que não há sinais de recuperação do investimento. A construção civil teve uma queda de 2,9%. No setor de serviços a maior retração ficou no comércio (atacado e varejo) com queda de 6%.

A queda generalizada por vários setores da indústria e dos serviços mostra que não se trata de uma crise pontual causada por um colapso em setores específicos da economia, pelo contrário, é uma crise que está disseminada nos vários setores. A queda de 7% na indústria de transformação, menina dos olhos dos desenvolvimentistas e suposta beneficiaria da desvalorização do câmbio que ocorre desde 2011, é mais um atestado do fracasso da agenda de contrarreformas iniciada com o objetivo de retomar o crescimento por meio de estímulos à indústria de transformação. Da mesma forma a contração de 12% na produção e distribuição de eletricidade, gás e água atesta o fracasso da política energética do primeiro governo Dilma.

Pela ótica da despesa o consumo das famílias caiu 0,9% mostrando que a crise continua atingindo o bem-estar dos brasileiros, não se trata mais de uma “crise que só economistas enxergam”. A queda do investimento foi de 7,8% o que significa que o fim da crise ainda deve demorar, o fato da queda do investimento ter vindo acompanhada de queda na produção e na importação de máquinas e equipamentos reforça a tese que o fim da crise está longe por sinalizar que não há disposição de investir por parte dos empresários. O consumo do governo caiu em 1,5%. No setor externo as importações caíram 4,7% como consequência da desvalorização do câmbio e da retração da renda, se eu tivesse de arriscar um palpite diria que o segundo fator foi mais importante. O fato de máquinas e tratores bem como petróleo e carvão estarem entre os destaques negativos das importações reforça a tese que a crise ainda está longe do fim. As exportações aumentaram 3,2%, aqui há uma ironia: o governo tem insistido na tese que nossa crise é consequência de uma crise internacional, porém a demanda externa por nossos bens foi o único componente da despesa que subiu. Como não sou (muito) turrão registro que o destaque positivo para indústria têxtil deve ser feito do câmbio, os outros destaques positivos nas exportações (petróleo e carvão, siderurgia e metalurgia não ferrosos) me parecem relacionados ao mercado externo e à crise interna. A análise do PIB pela ótica da despesa deixa dois recados fortes: (i) a queda do investimento sinaliza que a crise é profunda e que a Nova Matriz Macroeconômica fracassou em seu principal objetivo que era aumentar a taxa de investimento; (ii) se o PIB é determinado pela demanda o setor externo evitou uma crise ainda maior em nossa economia.

Olhando o acumulado nos quatro últimos trimestres observamos uma queda de 0,9% no PIB. Pela ótica da oferta a agropecuária cresceu 0,6%, a indústria encolheu 2,5% e os serviços caíram em 0,2%. Pela ótica da despesa o consumo das famílias cresceu 0,2%, o consumo do governo cresceu 0,4%, refletindo a gastança de 2014, o investimento caiu 6,9%, as exportações caíram 1% e as importações caíram 2,5%. Um gráfico que está na apresentação do IBGE (link aqui) e que eu reproduzo abaixo mostra o tamanho da queda do PIB em comparação a outros anos. Repare que desde o fim de 1997 o único trimestre com crescimento acumulado menor que o atual foi o quarto trimestre de 2009, no fundo poço da crise de 2008, que de fato foi uma crise internacional. A queda atual é mais que o dobro da queda do quarto trimestre de 1999 que ocorreu na sequência de uma série de crises em países emergentes que chegou oficialmente ao Brasil no primeiro trimestre de 1999 quando o regime de bandas cambiais que sustentou os primeiros anos do Plano Real colapsou.





Um último ponto a ser registrado é que a queda da taxa de investimento de 20,3% para 19,7% do último trimestre de 2014 para o primeiro trimestre de 2015 foi acompanhada de uma queda da taxa de poupança de 17% para 16% no mesmo período. Conquanto seja recomendado cuidado extremo com comparações de trimestres consecutivos o aumento da distância entre as duas taxas de 3,3% para 3,7% mesmo com uma queda significativa da taxa de investimento pode sinalizar para problemas futuros no balanço de pagamentos.



Um comentário:

  1. Dá pra acreditar que a coisa melhora no segundo semestre como os feiticeiros do governo estão dizendo?

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