quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Eu Sou Charlie!

Só porque Keynes comparou “O Capital” de Marx ao Corão, livro sagrado dos muçulmanos, (link aqui) não é motivo para os pretensos herdeiros de Marx se aliarem ao fundamentalismo islâmico. É verdade que não sou especialista em Marx nem conheço bem a biografia dele, mas pelo que conheço arrisco dizer que Marx não estaria defendendo o fundamentalismo islâmico no conflito com o Ocidente. A “força do progresso” e a “verdade histórica” não parecem estar do lado fundamentalismo.

Feita a provocação passo ao que interessa: o ataque à revista francesa “Charlie Hebdo” é um ataque ao Ocidente. A morte brutal de Stéphane Charbonnier não representa apenas o fracasso da França em garantir segurança a seus cidadãos, representa o fracasso do Ocidente em defender seus valores. Vejo alguns questionando os motivos de fazer certas charges ou expor certas opiniões, me incomodo com tais colocações, naturalmente não me ocorre prender ou matar quem as faz, mas me sinto sim incomodado. O motivo necessário e suficiente para alguém expressar uma opinião é a opinião existir, pedir algo além disso é um ataque a liberdade de expressão.

Seria o caso de dizer que a liberdade de expressão é parte da cultura ocidental. Que se hoje as mulheres do ocidente possuem os mesmos direitos que os homens é porque no passado humoristas puderam ironizar as crenças ocidentais que diziam o contrário. Que se hoje existe mais tolerância com a homossexualidade é porque no passado cartunistas ironizaram o sistema de crenças, religiosas ou não, que colocavam a homossexualidade como doença ou depravação. Que se hoje podemos criticar abertamente nossos governos é porque houve quem fizesse piada com soberanos absolutistas e tiranos republicanos. A cultura ocidental que já queimou cientistas, perseguiu outras religiões, colocou mulheres como cidadãs de segunda classe, prendeu homossexuais, escravizou africanos e outros povos e tantas barbaridades mais foi em ara graças à liberdade de expressão que mudamos nossos valores, nossa cultura, reconhecemos os erros e seguimos em frente.

Tendo tudo feito tudo isto não seria hipocrisia do Ocidente criticar o fundamentalismo islâmico? Tendo seus próprios fundamentalistas e totalitários o Ocidente pode lutar conta o dos outros? A reposta a esta pergunta e outras do tipo está no parágrafo abaixo (link aqui):

“This is, in fact, a masterly piece of logic. Anti-Slavery England cannot sympathize with the North breaking down the withering influence of slaveocracy, because she cannot forget that the North, while bound by that influence, supported the slave-trade, mobbed the Abolitionists, and had its Democratic institutions tainted by the slavedriver’s prejudices. She cannot sympathize with Mr. Lincoln’s Administration, because she had to find fault with Mr. Buchanan’s Administration. She must needs sullenly cavil at the present movement of the Northern resurrection, cheer up the Northern sympathizers with the slave-trade, branded in the Republican platform, and coquet with the Southern slaveocracy, setting up an empire of its own, because she cannot forget that the North of yesterday was not the North of to-day. The necessity of justifying its attitude by such pettifogging Old Bailey pleas proves more than anything else that the anti-Northern part of the English press is instigated by hidden motives, too mean and dastardly to be openly avowed.”

O parágrafo faz uma crítica aos ingleses que se recusavam a apoiar o Norte durante a Guerra Civil Americana alegando que o Norte também tinha seus pecados é de um texto publiaco em outubro de 1861 no New York Daily Tribune. O autor do texto? Um certo Karl Marx.

Sim, o Ocidente tem seus pecados e terá de viver com eles, mas a liberdade de expressão não é um destes pecados, pelo contrário, a liberdade de expressão faz parte do conjunto de instituições que permitiu ao Ocidente superar os próprios erros. Graças a liberdade de expressão um revolucionário alemão radicado na Inglaterra podia escrever em um jornal dos Estados Unidos. Os humoristas não são um apêndice indesejável da liberdade de expressão, pelo contrário são umas das forças que movem esta liberdade. Uma charge com um símbolo do poder ou um ícone religioso é uma ferramenta poderosas na desconstrução de tiranias e fundamentalismos.

E como ficam os ofendidos? Ficam ofendidos, ora bolas. Não comprem as revistas, não assistam os programas, não vejam os filmes e não assistam os shows. Façam propaganda contra. No limite acionem a justiça, algo que sou contra mas que está previsto na legislação de vários países ocidentais. Porém entendam que existem os que ficam ofendidos quando a liberdade de expressão é limitada.

Viva a Liberdade de Expressão! Stéphane Charbonnier viverá para sempre! Je suis Charlie!


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